Vida líquida e consumismo: compramos para preencher vazios?

Às vezes, compramos mais por tédio ou impulso do que por uma verdadeira necessidade. Por que fazemos isso?
Vida líquida e consumismo: compramos para preencher vazios?
Gema Sánchez Cuevas

Escrito e verificado por a psicóloga Gema Sánchez Cuevas.

Última atualização: 24 maio, 2020

Tudo nessa vida é uma contínua mudança: a política, os valores, as formas de pensar e de se relacionar, a educação, o mundo do trabalho, etc. Atualmente, vivemos em uma sociedade globalizada marcada pelo consumismo e pela perda das estruturas fixas do passado, o que tem como consequência um forte sensação de incerteza e perda de rumo.

O filósofo e sociólogo Zygmunt Bauman notou isso e refletiu em muitas de suas obras a comovente realidade na qual a sociedade atual está submersa: a vida líquida, na qual se sobressai a fragilidade dos vínculos afetivos, do crescimento da desigualdade e da desconexão generalizada.

Um cenário confuso, mas que demanda velocidade, egoísmo e individualidade.

Bauman afirma que a sociedade líquida se baseia na ideia de que tudo é temporário, instável, insubstancial e efêmero. Tudo tem data de validade.

Além disso, as redes sociais têm um papel fundamental, visto que nos permitem estar conectados e, ao mesmo tempo, desconectados. Vamos nos aprofundar um pouco mais nesse assunto. 

“O consumismo promete algo que não pode cumprir: a felicidade universal. E pretende resolver o problema da liberdade reduzindo-o à liberdade do consumidor”.
-Zygmunt Bauman-

Nosso vazio interior

O eterno vazio do consumismo na vida líquida

O homem líquido quer ser um cidadão sem amarras, responsabilidades ou compromissos. Apenas busca novas experiências, novos riscos e, por isso, não costuma solidificar suas raízes. Tudo o que começa permanece aberto, sem um encerramento, um ponto final. Tudo é passageiro e superficial…

Assim, tem origem em seu interior uma constante sensação de vazio existencial que não se sabe como preencher.

É por isso que a pessoa acaba mergulhando em uma corrente contínua de renovação, na qual o consumismo e a aquisição de bens materiais têm um grande protagonismo, pois é por meio deles que ela tenta preencher esse vazio existencial.

O problema é que os vazios do ser não podem ser preenchidos com o ter. Não é a quantidade que apaga a insatisfação constante, por mais que nos empenhemos. Isso apenas nos prende na insubstancialidade.

Os desejos insatisfeitos só nos levam a fantasiar com mais desejos, os quais escondem crenças e necessidades, principalmente se o foco de atenção estiver no externo, em vez de estar voltado para o nosso interior.

Nada escapa à liquidez da nossa sociedade. Como consequência, nossa individualidade se torna vazia e instável, e por vezes acaba levando a transtornos de identidade, crises de ansiedade ou depressão.

“No mundo atual, todas as ideias de felicidade acabam em uma loja”.
-Zygmunt Bauman-

Agir com responsabilidade

O que fazer diante de tanto caos e tanto vazio? Aprender a fluir como a água é uma das possíveis soluções. Trata-se de se moldar às diferentes circunstâncias, assim como a água faz com qualquer recipiente.

Para isso, cultivar a paciência e a auto-observação é fundamental, já que assim, pouco a pouco, sairão à luz nossas verdadeiras necessidades e o medo das mudanças vai se atenuar.

Além disso, é conveniente colocar em prática uma atitude crítica que nos leve a questionar certas condutas e hábitos. Assim, será mais fácil deter os comportamentos consumistas e de renovação que nos aprisionam em loopings infinitos nos quais nada se solidifica.

Também é necessário direcionar o foco de atenção ao nosso interior para, de uma vez por todas, nos conectar com nós mesmos, eliminar por completo esses remendos desnecessários que às vezes colocamos em nossos vazios e construir bases sólidas para o nosso bem-estar.

“Gastamos o dinheiro que não temos em coisas das quais não precisamos, para impressionar pessoas com as quais não nos importamos”.
-Will Smith-

Jovem preocupada com seus gastos

Como praticar o consumismo responsável?

  • Faça uma lista do que você realmente precisa, além de estabelecer um orçamento máximo para gastar.
  • Concentre-se no que você tem.
  • Recicle antes de comprar coisas novas.
  • Busque alternativas às compras. Muitas vezes compramos por tédio. É importante ter uma atividade alternativa para esses momentos, como praticar algum esporte ou qualquer outra atividade que reduza o impulso de comprar de forma irresponsável e desnecessária.
  • Simplificar a vida para experimentar uma maior satisfação.
  • Ter mais amor-próprio. É importante fazermos tudo o que gostamos de fazer para nos sentirmos bem com nós mesmos e sermos mais felizes.
  • Comprar em fogo lento para não elevar os sintomas de ansiedade. É fundamental identificar possíveis emoções negativas durante as compras e, se necessário, procurar um profissional para tratar essas emoções.
  • Ler sobre marketing. Nunca é demais saber um pouco mais sobre como as marcas ou empresas nos “enganam” para não fazer compras desnecessárias.
  • Limitar a assinatura de novidades ou descontos de marcas e empresas nos e-mails. Todos os dias recebemos ofertas via e-mails que podem nos levar a comprar sem necessidade. Muito cuidado.
  • Comprar experiências. Cada um decide como viver sua vida, mas não podemos nos esquecer de que as experiências permanecem no nosso coração, enquanto os objetos não tanto…

Como vemos, a questão não reside em ter mais e mais, mas em ser, em se cultivar por dentro para refletir isso no exterior com uma atitude contemplativa, paciente e enriquecedora.

Vamos parar de correr a toda velocidade. Vamos parar um pouco, fechar os olhos e apreciar o silêncio, essa bonita experiência capaz de tranquilizar nossa mente, frear os impulsos e nos aproximar do bem-estar.


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  • Bauman, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
  • Bauman, Zygmunt. Vida líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007.

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