Você sabe o que é parentificação emocional?

Há crianças que se tornam confidentes e conselheiras de seus próprios pais. Um exemplo disso é quando uma mãe despeja sobre a filha todos os problemas que sofre no casamento... Conhecemos essa dinâmica como parentificação emocional.
Você sabe o que é parentificação emocional?
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 29 dezembro, 2022

A parentificação emocional é uma dinâmica nociva e invisível que aparece em muitas famílias. Acontece quando uma criança se torna confidente ou conselheira de um de seus pais. Essa realidade forma um tipo de trauma invisível do qual nem sempre se fala e que, no entanto, muitas pessoas carregam atualmente.

Há muitos adultos que foram filhos parentificados, atuando assim como cuidadores de seus pais. Além disso, também se tornaram aquelas figuras que sempre mediavam os problemas dos adultos. Ter que dar esse passo e assumir responsabilidades que não são apropriadas para alguém de 8, 10 ou 12 anos altera completamente o desenvolvimento psicossocial da pessoa.

São múltiplas as causas que orquestram esse tipo de circunstância. Elas podem variar desde problemas financeiros até distúrbios de saúde mental ou vícios. São situações de alto estresse que inoculam uma carga emocional amarga e adversa, capaz de deixar marcas para o resto da vida. Vamos nos aprofundar neste tema.

Menina triste chorando e simbolizando a parentificação emocional
Ter que ser cuidador ou confidente dos pais altera o desenvolvimento psicossocial.

Parentificação emocional: características e origens

Parentificação é um termo cunhado pelo psiquiatra Ivan Boszormenyi-Nagy que define as situações em que uma criança assume as responsabilidades típicas de um adulto. Essa perturbação nos limites geracionais, com a inversão dos papéis, sacrifica completamente as necessidades próprias da infância. Além disso, o seu desenvolvimento psicossocial também é afetado.

Se pensarmos bem, esses tipos de situações eram frequentes no passado. Muitas de nossas avós, por exemplo, costumavam nos contar como tiveram que cuidar de seus irmãos e parentes quando eram crianças. Há poucas décadas atrás, as meninas assumiam desde muito cedo responsabilidades que não eram típicas de sua idade. A mesma coisa acontecia com os meninos.

De fato, ainda é comum ver essa prática em países do terceiro mundo. Entretanto, dentro da parentificação, ou seja, desse processo em que um menor exerce as obrigações de um adulto, há uma dinâmica particular. Estamos falando daquela que diz respeito ao mundo das emoções.

Podemos definir a parentificação emocional como uma prática na qual uma criança se torna confidente, conselheira e cuidadora emocional de um adulto. Essa realidade tem um custo psicológico imenso para a mente da criança.

A parentificação emocional geralmente aparece em famílias nas quais um dos pais sofre de depressão ou transtorno psicológico.

“Incesto emocional”, uma prática nociva muito comum

Os especialistas costumam rotular a parentificação emocional como uma forma de “incesto psicológico”. De repente, a criança assume (em nível psicológico) uma responsabilidade semelhante à de um parceiro afetivo. Ou seja, ela precisa ouvir sobre os medos, preocupações, desejos e necessidades de seus pais. E isso não é tudo. Muitas vezes, o adulto chega até mesmo a pedir conselhos ao próprio filho.

Despejar sobre uma criança as insatisfações de um adulto com a vida, bem como seus problemas psicoemocionais, não deixa de ser uma forma óbvia de abuso psicológico. Afinal, a carga mental pode ser enorme. Um exemplo disso ocorre quando uma mãe conta ao filho de 9 anos todos os seus problemas no casamento.

Devemos ter em mente que nenhum menino ou menina está mentalmente e emocionalmente preparado para ser um confidente e conselheiro dos seus pais. No entanto, essa é uma dinâmica que aparece em muitas famílias.

Características da parentificação emocional

A parentificação emocional se manifesta de diversas maneiras e, em geral, a criança começa a sofrê-la desde muito cedo. Muitas vezes, podemos ter pequenos de 5 ou 6 anos que, ainda que não entendam exatamente o que seus pais estão dizendo, já agem como ouvintes passivos dos seus problemas com a vida.

Vamos ver outras características e comportamentos associados:

  • Os pais só falam com os filhos sobre as suas próprias necessidades e problemas. As realidades próprias da criança ficam em segundo plano.
  • Os pais atribuem aos filhos capacidades maduras que eles não possuem. Projetam neles a ideia de que já estão crescidos e que podem assumir a responsabilidade por quase qualquer coisa. Dessa forma, eles ficam condicionados a carregar sobre si tarefas que não são apropriadas para a sua idade.
  • Todos os tipos de intimidades, problemas, necessidades, medos e ansiedades são compartilhados com eles. Além disso, muitas vezes são até mesmo solicitados a dar conselhos.
  • Da mesma forma, é comum que essas crianças precisem cuidar de seus pais quando choram, sofrem de ansiedade, estresse ou insônia. Essa responsabilidade faz com que, às vezes, faltem às aulas.
  • Muitos dos adultos que exercem a parentificação emocional cometem atos autolesivos (tentativas de suicídio).

Efeitos de ser confidente e cuidador emocional de adultos

A Universidade de Varsóvia realizou um interessante estudo sobre os efeitos da parentificação emocional. Uma das consequências mais comuns de ter passado por esse tipo de experiência durante a infância é o risco de sofrer de transtornos depressivos na idade adulta.

Quando nossos pais nos transformam em objetos que servem para promover a sua própria regulação emocional, todos os tipos de necessidades e direitos emocionais nos são negados. Além disso, estar submetido a um ambiente parental com base na dependência traça um desenvolvimento social e psicoafetivo muito complexo:

  • Um dos efeitos da parentificação emocional é o desenvolvimento de uma baixa autoestima. Além disso, também se tira espaço das próprias necessidades emocionais, algo que se traduz a curto e longo prazo em estresse, ansiedade, etc.
  • Na idade adulta, existe um risco maior de estabelecer relações que também se baseiam na dependência.
  • Geralmente aparecem distúrbios psicossomáticos, assim como possíveis distúrbios no comportamento alimentar, riscos de vícios, etc.
Menina abraçando sua mãe representando parentificação emocional
Crianças que sofreram parentificação emocional correm maior risco de sofrer transtornos de humor

Qual é a origem dessa dinâmica familiar?

A criança parentalizada geralmente tem pais claramente imaturos. Isso pode ocorrer como consequência de algum problema mental ou de uma clara incapacidade para assumir o papel de pai ou mãe. Assim, em geral, os substratos que alimentam este tipo de dinâmicas tão prejudiciais para o desenvolvimento de uma criança são os seguintes:

  • Pais deprimidos que, muitas vezes, carregam os seus próprios traumas psicológicos.
  • Pais com problemas de apego (concentram todas as suas necessidades emocionais na criança).
  • Vícios.
  • Doenças crônicas ou deficiências.
  • Pais que se envolvem em comportamento abusivo com seus filhos.

Para concluir. É necessário que, a partir do meio social de cada criança, possamos identificar os problemas associados à parentificação, seja ela emocional ou instrumental. Afinal, poucas coisas são mais prejudiciais do que perder a infância, do que crescer em um ambiente em que as necessidades psicoemocionais de cada criatura não são atendidas.


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