Ambivalência afetiva: quando o amor e o ódio coexistem em nós
A ambivalência afetiva é um tipo de emoção complexa; nela habitam a contradição e a tensão. Um exemplo disso é, sem dúvida, quando amamos e odiamos alguém quase ao mesmo tempo. Ter um grande carinho por uma pessoa próxima, mas ao mesmo tempo experimentar um certo ressentimento. Amar um amigo, mas sentir que esse relacionamento nos machuca…
Por que as pessoas sofrem com esses tipos de sentimentos conflitantes e até mesmo adversos? É normal ou responde a algum tipo de desequilíbrio? A resposta é simples: estamos diante de um tipo de realidade perfeitamente normal e que, por sua vez, define a alta complexidade do ser humano em questões emocionais.
Este tema, além disso, desperta um grande interesse na comunidade científica, que realizou diversas pesquisas e estudos a esse respeito. Algo que, para nós, pode parecer digno de uma novela, corresponde, para os neurologistas, psiquiatras e especialistas em psicologia emocional, a um fato que é um bom exemplo de quão intrincada pode ser a estrutura emocional dos nossos relacionamentos.
Assim, autores como Frenk van Harreveld, do departamento de psicologia social da Universidade de Amsterdã, apontaram em um estudo que a ambivalência afetiva determina não apenas o que sentimos, mas é também aquela complexidade interna que nos leva a nos comportar de certas maneiras. Um exemplo: há mulheres que, durante o puerpério, vivenciam uma clara ambivalência emocional.
Elas amam seu bebê recém-nascido, mas em instantes, devido à alta demanda e dependência do pequeno, podem experimentar uma mistura caótica de exaustão, rejeição, ternura e medo que tanto define aqueles primeiros meses entre mãe e filho. Veremos mais informações sobre isso.
“Você sabe que quando eu te odeio, é porque eu te amo ao ponto de paixão que desequilibra a minha alma”.
-Julie de Lespinasse-
Ambivalência afetiva: características que a definem
A ambivalência afetiva é sentida (sofrida ou desfrutada) por todo ser humano em algum momento de sua vida. Sabemos que, quando falamos de emoções, é comum que nomes como Daniel Goleman ou Paul Eckman nos venham à mente. Agora, pode-se dizer que este assunto é estudado desde o início do século XX.
Foi o psiquiatra Eugen Bleuler quem, em 1911, descreveu a ambivalência afetiva como uma “presença simultânea de dois sentimentos opostos (atração e repulsa), de duas direções opostas da vontade, em relação ao mesmo objeto“.
Desde então, o campo da psicologia tem estado constantemente interessado em um assunto que parece estruturar diferentes áreas. Além disso, apesar do fato de a ambivalência afetiva ser tão comum em nossos relacionamentos afetivos, a psicologia social também tem se interessado por essa área nos últimos anos.
A razão? Muitas das decisões que tomamos são orquestradas pela contradição (quero comprar isso, mas não posso agora, quero aquele emprego naquele país, mas não ouso deixar minha casa aqui, etc.).
A contradição gera desconforto
A ambivalência afetiva ou emocional gera um alto nível de desconforto. E se há algo de que o cérebro humano não gosta, é a contradição, os pontos que não estão alinhados.
A energia e o desgaste produzidos por esse tipo de dissonância são imensos. Tanto é assim que muitas vezes somos bloqueados por esses sentimentos e nos tornamos conscientes do grande amor ou afeto que experimentamos por algo ou alguém, mas, ao mesmo tempo, sentimos uma certa exaustão, rejeição e até ódio.
Podemos amar alguém, mas detestar seu comportamento, suas atitudes e até mesmo sua maneira de nos tratar. Lembre-se, por sua vez, da nossa fase na adolescência. Essa parte do nosso ciclo de vida é uma constante contradição, é uma busca de experiências, é medo, é ansiedade, é desejo, intensidade e angústia ao mesmo tempo. Não é fácil assumir este tipo de contradições internas, todos nós estamos conscientes disso.
A ambivalência emocional nos leva a decidir
Sabemos que a ambivalência afetiva ou emocional é sinônimo de contradição. Agora, há um efeito positivo sobre ela que nos leva a decidir, a esclarecer ou até mesmo a aceitar certas situações. A mãe que passa pelo período complexo do puerpério está gradualmente assumindo e se acostumando com sua nova realidade.
Quando amamos e odiamos alguém, ao mesmo tempo, nos forçamos a compreender a realidade desse sentimento. O amor pesa mais? A contradição é algo natural nessa paixão que sentimos pelo parceiro? Ou talvez esse ódio seja um fato do qual preciso ter consciência para tomar uma decisão?
A Dra. Laura Rees, da Universidade de Michigan, realizou um estudo em 2013 para nos mostrar algo interessante. A ambivalência afetiva favorece a autoconsciência. Esse desconforto é algo que nosso cérebro precisa aplacar e resolver. De fato, foi demonstrado que esse tipo de contradição aumenta nossa criatividade, nos leva a procurar canais para pensar, desabafar e encontrar respostas originais para resolver a questão.
Para concluir, podemos apontar um pequeno aspecto. Sempre que nos virmos neste tipo de labirinto pessoal em que somos perseguidos pela contradição emocional, vale a pena parar, escutar e compreender. Talvez haja algo que devemos resolver ou até mesmo assumir.
A vida em si é contraditória e os sentimentos são ainda mais. Amar não é fácil e requer uma alta responsabilidade, bem como um compromisso, primeiro com nós mesmos e depois com os outros.
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- Sincoff, J. B. (1990). The psychological characteristics of ambivalent people. Clinical Psychology Review, 10(1), 43–68. https://doi.org/10.1016/0272-7358(90)90106-K
- Van Harreveld, F., Nohlen, H. U., & Schneider, I. K. (2015). The ABC of Ambivalence: Affective, Behavioral, and Cognitive Consequences of Attitudinal Conflict. In Advances in Experimental Social Psychology (Vol. 52, pp. 285–324). Academic Press Inc. https://doi.org/10.1016/bs.aesp.2015.01.002