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O que “dar conselhos” revela sobre como vemos os problemas dos outros

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Você sabe exatamente o que dizer ao seu amigo, mas não diz a si mesmo. Por que é tão difícil colocar em prática o que aconselhamos? Nós te contamos.
O que “dar conselhos” revela sobre como vemos os problemas dos outros
Última atualização: 30 agosto, 2025

Imagine uma situação como esta: Carlota, num tom firme, mas carinhoso, diz à sua melhor amiga, Francesca, que ela deveria se valorizar mais e deixar aquele relacionamento que não lhe faz bem. O curioso é que, enquanto fala, Carlota continua presa a um trabalho que a desgasta e não a motiva mais. Ela sabe disso, mas não age. Às vezes, é mais fácil dar conselhos do que colocá-los em prática.

É aí que a expressão “amigo, perceba” faz sentido, porque quando não estamos emocionalmente envolvidos, pensamos com mais lógica e distanciamento, evitando olhar para dentro o que dói. Por que isso acontece conosco? O que nos torna tão lúcidos quando se trata de opiniões, mas tão lentos para agir por conta própria?

Tomar distância muda a maneira como vemos as coisas

Obtemos insights sobre os problemas dos outros porque, quando os observamos de fora, não sentimos o mesmo peso emocional. Na psicologia, isso está associado a fenômenos como o distanciamento psicológico ou o efeito ator-observador, que explicam por que analisamos as experiências dos outros com mais lógica, mas temos dificuldade em fazer o mesmo com nossas próprias decisões.

É como quando você está assistindo a um filme de terror e grita: “Não abra essa porta!” Do seu sofá, o perigo é óbvio, mas para a pessoa imersa em tensão e incerteza, pensar com clareza é mais difícil. Por outro lado, se estivermos passando por um conflito pessoal – um relacionamento instável, esgotamento no trabalho ou uma decisão que estamos adiando – o medo, o desejo ou o afeto nos levam a justificar o que, de fora, pareceria insustentável.

Além disso, um estudo publicado na Psychological Science em 2019 descobriu que dar conselhos aos outros pode aumentar temporariamente os sentimentos de autoeficácia e controle. Isso explicaria por que, quando damos conselhos, sentimos que tudo está em ordem… até que precisamos aplicá-los em nossas próprias vidas.

Caímos na armadilha da autojustificação

Outro motivo pelo qual é mais fácil dar conselhos do que colocá-los em prática é que , quando tomamos decisões questionáveis, tendemos a justificá-las para não sentir que falhamos. Nosso cérebro rejeita a ideia de ter cometido um erro, então constrói argumentos para apoiar o que fizemos, mesmo que, no fundo, saibamos que não foi a melhor coisa a fazer.

Isso tem um nome em psicologia: dissonância cognitiva. Refere-se ao desconforto que sentimos quando há uma contradição entre o que pensamos e o que fazemos. Para reduzir esse desconforto, nossas mentes buscam explicações que nos façam sentir melhor conosco mesmos.

Por exemplo, se você está namorando alguém que não te valoriza, você pode pensar que “as coisas boas superam as ruins”. Isso suaviza o conflito interno entre o que você sabe e o que você decide. Mas se um amigo lhe contar uma história semelhante, você facilmente identifica o que está errado, porque não precisa proteger o ego dele… ou o seu. E não é que sejamos incapazes de autocrítica, mas às vezes precisamos manter uma imagem consistente de nós mesmos.

A pressão do ambiente também pesa

Às vezes, não aplicamos os conselhos que daríamos a outra pessoa porque não estamos sozinhos em nossa história. Há pais que esperam que você seja forte, amigos que dizem que “tudo se resolve com paciência”, parceiros que se ofendem se você decidir mudar ou chefes que insinuam que você não deve reclamar.

Quando aconselhamos os outros, fazemos isso a partir de uma posição de liberdade em relação às consequências: não precisamos lidar com as reações das pessoas ao nosso redor. Mas, ao contrário, o medo do que os outros vão dizer, de decepcioná-los ou de destruir a imagem que os outros têm de nós pode ser paralisante. Sabemos o que precisa ser feito, mas não queremos carregar o fardo do julgamento que pode advir.

Portanto, mesmo que digamos com convicção: “Você merece algo melhor”, às vezes continuamos a tolerar situações desconfortáveis para corresponder às nossas expectativas. Aplicar conselhos exige coragem, mas também exige assumir o controle de tudo o que pode abalar as coisas ao nosso redor.

Como começar a aplicar o que aconselhamos?

Se você já entendeu por que é mais fácil dar conselhos do que colocá-los em prática, talvez esteja se perguntando o que pode fazer para ser mais consciente das suas próprias decisões. Aqui estão algumas ideias práticas:

  • Pratique a autocompaixão: Julgar não ajuda. É melhor se perguntar por que você está agindo dessa maneira e o que você precisa para tomar decisões mais alinhadas com você.
  • Pense como se você fosse seu melhor amigo: você recomendaria permanecer na situação em que está? Você justificaria para si mesmo o que está justificando agora? Essa mudança de perspectiva ajuda você a ganhar clareza.
  • Escreva seu próprio conselho: Pegue caneta e papel. Descreva sua situação como se fosse outra pessoa e, em seguida, escreva o que diria. Ao ler em voz alta, você perceberá se há contradições ou verdades que você tem evitado.
  • Aceite que às vezes dói abrir os olhos: nem sempre estamos prontos para ver tudo. E tudo bem. Às vezes, leva tempo ou alguém que lhe diga carinhosamente: “Amigo, chegue a uma conclusão”, para que você comece a ver o que não conseguia ver sozinho.

Todos nós, em algum momento, já vimos claramente o que outra pessoa não vê. E todos nós já estivemos do outro lado, sem perceber o que é óbvio para os outros. Então, da próxima vez que sentir vontade de dar um conselho, pergunte-se: Eu também aplico isso na minha vida? E se a resposta for não, não se culpe. Apenas respire, observe-se honestamente e dê-se permissão para seguir em frente no seu próprio ritmo, mesmo que tudo não esteja tão claro no início.


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