Cérebro prospectivo ou o poder de prever o futuro

No cérebro, temos uma rede neural sofisticada que nos permite lembrar nosso passado pessoal e imaginar e "prever" o futuro. É um processo que colocamos em prática todos os dias.
Cérebro prospectivo ou o poder de prever o futuro
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 29 dezembro, 2022

O cérebro prospectivo nos permite imaginar o futuro e planejar ações que possam tornar esse imaginário possível. Também facilita a criação de expectativas e previsões. Isso, que pode parecer mágico para nós, é na verdade um processo sofisticado, que tanto as pessoas quanto os animais colocam em prática.

Um exemplo, estamos dirigindo em uma rodovia e de repente começa a chover forte. O cérebro prevê que, como já aconteceu em outras ocasiões, o mais provável é que o caminho que sempre usamos como desvio para chegar mais cedo em casa acabe se fechando. Então optamos por outra estratégia: pegar uma rota alternativa (mais longa) conhecida.

Temos outro exemplo de pensamento prospectivo em nossos cães. Basta que nos vejam com a coleira na mão para que se posicionem para sair à rua. Além disso, animais como corvos ou certos primatas guardam objetos que sabem que podem usar no futuro como ferramentas para obter alimentos.

Todos nós temos a capacidade de prever certos eventos futuros. Antecipar e imaginar certas situações nos permite planejar para melhor nos adaptarmos aos nossos ambientes complexos.

“Estou interessado no futuro porque é o lugar onde vou passar o resto da minha vida.”

-Woody Allen-

Mulher pensando sobre o cérebro em perspectiva

O cérebro prospectivo, uma máquina perfeita

Em 2007, o Dr. Daniel L. Schacter, da Universidade de Harvard, explicou algo muito revelador em uma pesquisa. Cada um de nós tem uma rede neural em nosso cérebro que nos permite lembrar o passado e, por sua vez, imaginar o futuro. Essa rede também estaria conectada com várias regiões do cérebro, como o lobo temporal medial, o córtex pré-frontal medial, o córtex temporal lateral e as regiões posteriores do córtex parietal medial e lateral.

Este processo interessante foi descoberto após a realização de uma tomografia por emissão de pósitrons (TEP) em uma grande quantidade de voluntários. Percebeu-se que quando solicitados a falar sobre o passado ou o futuro, exatamente as mesmas áreas foram ativadas. E que isso aconteça não é por acaso, pois para “prever” o futuro precisamos lembrar o passado.

Memória prospectiva: preparando-se para o amanhã lembrando o passado

Para entender a utilidade e a singularidade do cérebro prospectivo, primeiro é aconselhável diferenciar a memória retrospectiva da prospectiva. Para começar, a primeira envolve lembrar de eventos, experiências ou pessoas do nosso passado. No entanto, a memória voltada para o futuro nos permite evocar planos que devemos fazer no futuro, mas que planejamos no passado.

Tarefas como enviar aquele relatório por e-mail ou saber como agir quando há um pequeno incêndio na casa são ações que planejamos no passado para poder agir no futuro. Esta é uma estratégia decisiva para a nossa sobrevivência e uma função cognitiva crucial do nosso cérebro.

As pessoas constantemente fazem previsões sobre o futuro. Dessa forma, temos maior controle sobre os eventos ao planejar determinadas ações.

O cérebro prospectivo: uma “máquina de antecipação”

Daniel Clement Dennett é um conhecido filósofo americano especializado em ciências cognitivas e autor de livros como A Consciência Explicada (1991). Em suas obras ele explica que somos dotados de uma máquina de antecipação perfeita. Porque se o cérebro humano tem um propósito, é “produzir o futuro”. Agora, o que significa isso?

Vamos pensar em algo muito simples: se existe um processo mental que realizamos todos os dias, é o de criar expectativas. Imaginar, pensar e até fantasiar… Uma parte do nosso olhar interno está sempre localizado no futuro. E não, pensar no amanhã não é algo negativo ou patológico, é natural.

As pessoas precisam especular sobre o futuro para evitar os perigos e aproveitar as oportunidades. Como curiosidade, uma das primeiras figuras a se interessar pelo poder das expectativas e a forma como a mente se concentra no amanhã foi Charles Dickens.

Houve uma época em que Dickens constantemente voltou sua atenção para dimensões como a ilusão, imaginação, desejos proféticos, futuro previsão, e suas decepções… Fora de tudo o que inspira substrato veio obras como Dombey e Filho (1846-1848) e Grandes esperanças (1860-1861).

A visão de futuro nos permite especular com antecedência sobre o que pode acontecer e como agir. Isso nos permite ter um certo senso de controle e até mesmo poder tirar proveito de certos futuros.

Mulher com bola de cristal se perguntando sobre o cérebro em perspectiva

Prever sobreviver e moldar um “eu futuro” mais feliz

Passamos a vida fazendo previsões, algumas se realizam e muitas outras não. Por exemplo, prevemos que nosso filho ficará feliz se comprarmos sorvete para a sobremesa. Sabemos como nosso parceiro reagirá quando comentarmos acerca da necessidade de terapia. E ainda temos algumas estratégias simples à mão para apoiar nosso melhor amigo quando ele está de mau humor.

Usamos nossos cérebros com visão de futuro para nos relacionarmos melhor com os outros, para lidar com possíveis dificuldades futuras e também para criar uma imagem mais positiva de nós mesmos. E como alcançamos este último?

Todos nós temos uma visão do nosso “eu futuro” que gostaríamos de alcançar, e esse propósito nos encoraja a fazer mudanças no presente. Projetar-se no amanhã de forma positiva é um impulso para o aqui e agora. Porque, afinal, a felicidade não está apenas em “ser”, está também em “tornar-se”. Sonhar, imaginar e prever o futuro também é mais uma porta para o bem-estar.


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  • Schacter, D., Addis, D. & Buckner, R. Remembering the past to imagine the future: the prospective brain. Nat Rev Neurosci 8657–661 (2007). https://doi.org/10.1038/nrn2213

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