O efeito McGurk: quando ouvimos com os nossos olhos

Às vezes, quando não conseguimos ouvir uma pessoa claramente, olhamos para a sua boca. No entanto, quando tentamos "ouvir com nossos olhos" e ler seus lábios, podemos cometer pequenos erros. Este é o efeito McGurk.
O efeito McGurk: quando ouvimos com os nossos olhos
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 15 novembro, 2021

Todos nós já vimos um filme mal dublado em que tivemos que fazer leitura labial para entender o que ator estava dizendo. De repente, percebemos que estamos “ouvindo com os olhos”, ou seja, estamos decifrando sons por outro canal que não o auditivo. Este fenômeno no qual há uma incompatibilidade entre os sinais sonoros e visuais é conhecido como efeito McGurk.

Embora essa experiência possa nos levar a cometer alguns erros que analisaremos a seguir, ela também se destaca como uma estratégia muito eficiente do cérebro. Por exemplo, podemos estar em uma festa com música muito alta e, quando tentamos conversar com alguém, o que fazemos é olhar para a sua boca para tentar “ler” suas palavras.

Há algo importante que este efeito nos mostra. As pessoas não usam cada um dos seus sentidos separadamente. Na realidade, toda experiência perceptiva acontece como resultado da interação dos sentidos. A visão e a audição trabalham juntas, de modo que, embora às vezes possam ocorrer pequenos erros, elas são nossas melhores aliadas.

Pessoas com doença de Alzheimer frequentemente experimentam distúrbios do efeito McGurk: elas não conseguem identificar sons e palavras visualmente.

Figuras se comunicando para simbolizar o efeito McGurk

O que é o efeito McGurk?

Muitos dos nossos processos de comunicação ocorrem em situações em que podemos ouvir uns aos outros claramente. No entanto, nos últimos tempos, após o aumento das chamadas de vídeo, estamos experimentando o efeito McGurk com mais frequência.

Às vezes, por causa das conexões ruins, não ouvimos bem o outro e passamos do conduto auditivo para o visual para tentar ler os lábios, mas não é nada fácil. Às vezes, mesmo tendo como referência o rosto e a boca da pessoa, erramos.

Esse fato foi estudado na década de 1970 pelos psicólogos cognitivos Harry McGurk e John MacDonald. Foi como resultado de um trabalho de pesquisa de 1976 que esse termo foi cunhado pela primeira vez no artigo Hearing Lips and Seeing Voices.

Eles fizeram isso depois de verificar algo muito específico em um experimento famoso. Um fato comprovado há décadas e que nunca falha. Se alguém mover os lábios pronunciando a sílaba “ga”, mas ao mesmo tempo em voz alta o que ele diz é “ba”, o cérebro ouvirá “da”. Em outras palavras, às vezes o que os olhos leem não é o mesmo que o ouvido percebe.

Por que o efeito McGurk ocorre?

Já sabemos que o efeito McGurk acontece quando tentamos “ler” com os olhos e o que vemos (movimento dos lábios) não corresponde ao som real. Bem, é interessante notar que a região do cérebro onde esse fenômeno ocorre é no sulco temporal superior. Ao tentar decodificar duas modalidades sensoriais (visão e som), é comum o aparecimento de erros.

O Departamento de Neurocirurgia do Houston Medical College (Texas) apontou algo importante em um estudo: quando temos uma conversa cara a cara, o cérebro escuta pelo ouvido e também decifra as palavras com os olhos. Fazemos isso inconscientemente.

Atentar para o movimento dos lábios nos permite reforçar a comunicação em caso de dificuldades, como ruído ambiental. No entanto, existem sons e sílabas que são mal interpretados. Ocorrem pequenas inferências, pequenos erros.

Existem pessoas que sofrem esta experiência em maior grau

Nós apontamos isso no início. Pessoas com doença de Alzheimer são gravemente afetadas pelo efeito McGurk. Se em algum momento eles tiverem que ler os lábios para entender uma mensagem, não serão capazes de decifrá-la.

Trabalhos de pesquisa como os realizados por Delbeuck, Collette e Van der Linden (2007) indicam que a causa pode estar na deterioração da conectividade do cérebro.

Da mesma forma, também foi constatado que crianças com transtorno de linguagem expressiva não prestam atenção à articulação das palavras, não utilizam o canal visual para imitar ou compreender o que lhes é expresso. Isso dificulta o desenvolvimento da linguagem.

O sistema visual nos ajuda a discriminar sons

O efeito McGurk aparece quando lemos os lábios de outras pessoas e confundimos algumas sílabas ou palavras. É algo completamente normal que mostra algo interessante. O ser humano sempre utiliza o sistema visual durante a comunicação. Não é algo a que apenas as pessoas com deficiência auditiva recorrem.

O cérebro precisa ter certeza de que o processo de comunicação está sendo realizado de forma eficiente. Para isso, não se limita apenas a ouvir e fazer uso do sentido da audição: também usa a visão.

Olhar para a boca do nosso interlocutor facilita a compreensão em qualquer contexto, daí a importância das conversas cara a cara. Ler com os olhos é mais uma habilidade da qual podemos nos orgulhar.


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