Inquietação em espaços “vazios”? Você certamente já experimentou kenopsia

Um corredor da escola à noite. Uma estação de trem deserta. Um antigo parque de diversões em completo abandono. A kenopsia está presente só de imaginar esses cenários.
Inquietação em espaços “vazios”? Você certamente já experimentou kenopsia
Sharon Laura Capeluto

Escrito e verificado por a psicóloga Sharon Laura Capeluto.

Última atualização: 21 setembro, 2024

Visitar um teatro abandonado. Andar pelas ruas de uma cidade desabitada. Passar na frente de uma escola fechada. Mergulhar nesses lugares pode despertar em nós a kenopsia, aquela sensação única de nostalgia ao presenciar a quietude de espaços que outrora vibravam com vida.

Nomear as emoções que sentimos, mas que achamos difíceis de expressar em palavras, proporciona um alívio significativo. Vamos conhecer mais sobre esse sentimento curioso e melancólico que todos nós vivenciamos em algum momento.

O que é kenopsia?

John Koeing criou o The Dictionary of Obscure Sorrows com o objetivo de dar um nome àquelas emoções que todos sentimos, mas não sabemos como expressar, pois carecem de um termo específico. A kenopsia é uma delas.

O autor descreve este neologismo como “a atmosfera esmagadoramente triste de um lugar que normalmente está cheio de gente, mas que no momento está abandonado e silencioso”. Sua etimologia deriva do grego kenosis que significa “vazio” e opsia que significa “ver”. Ver o vazio. Sentir o vazio.

Vai além do impacto visual gerado por um local desprovido de atividade. Está associado à estranha sensação de perceber a essência sombria do que era. Assim, ao caminharmos por uma avenida desabitada e com todos os comércios com as venezianas fechadas, uma melancolia difícil de expressar em palavras nos invade.

Você já teve que ir ao escritório em uma manhã de domingo e o encontrou mergulhado na escuridão e no silêncio? Já visitou uma escola sem crianças durante as férias escolares e foi inevitável sentir nostalgia? É isso o que queremos dizer.

Quais são as causas psicológicas dessa experiência?

As razões por trás desse sentimento peculiar de vazio não são claras. Porém, existem alguns fatores psicológicos que podem ter relação direta e representativa com sua origem.

A lei do fechamento

Na psicologia, existe um fenômeno fascinante que está ligado à tendência humana de preencher espaços vazios. É conhecida como lei do fechamento e é um dos princípios da Gestalt.

É intrigante observar como nosso cérebro, diante de algo incompleto, seja algo visualmente perceptível, como um círculo não fechado, ou algo abstrato, como uma história sem fim, tende a preencher essas lacunas.

Nossa mente busca completar padrões, formas ou informações com base em conhecimentos prévios. Poderíamos pensar, então, que a experiência humana não lida bem com a ausência. Ou, pelo menos, a nossa tolerância ao vazio é limitada. Ficamos desconfortáveis com espaços em branco.

O problema é que, em última análise, temos medo de ficar sozinhos. Nesse sentido, esse fenômeno parece nos alertar para a imprecisão e nos confronta com um abismo perturbador e desconhecido.

Vida comunitária

Outra razão que pode nos ajudar a entender por que ocorre a kenopsia é a necessidade humana de viver em comunidade e de estar em contato com outras pessoas. Não podemos esquecer que somos seres sociais.

Desde os tempos antigos, a vida em grupo tem perdurado como uma estratégia adaptativa eficaz para nos proteger de perigos potenciais. Hoje em dia, estar rodeado de outras pessoas é tão comum para nós que nos acostumamos. Estamos em constante interação com outros seres humanos que vivem, choram, riem, gritam, saltam.

Mas o que acontece quando a agitação habitual desaparece? O silêncio começa a atordoar e o vazio torna-se sufocante. É impossível não se sentir incomodado diante de tanta ausência.

A partir desse contraste, dessa falta da vida agitada que tínhamos como certa, uma súbita e repentina sensação de solidão nos invade, alertando-nos para algo que não vai bem. Como se o abandono fosse iminente. Em suma, a kenopsia revela o nosso desejo intrínseco de estar com os outros.

Apego emocional e medo do desconhecido

Essa emoção sombria também pode estar ligada ao medo do desconhecido. É possível que a falta de atividade humana crie um ambiente em que o familiar se torne estranho e desconcertante. Por sua vez, esse cenário talvez desperte ansiedade e medos associados àquilo que não compreendemos em termos absolutos.

Além disso, a ligação emocional com esses ambientes agora vazios pode dar origem a um sentimento de perda e intensa melancolia. Dessa forma, a kenopsia pode se intensificar quando há apego emocional a esses locais.

Kenopsia no contexto da COVID-19

A pandemia da COVID-19 espalhou a kenopsia por quase todos os cantos do mundo, transformando-a num sentimento partilhado globalmente. Parecia inimaginável ver lugares icônicos, como a Times Square, desprovidos de atividades típicas.

Nessa situação, o vazio foi repentino e, talvez por isso, ainda mais chocante. A vida diária foi abruptamente interrompida. As grandes cidades, que antes eram movimentadas, pararam da noite para o dia.

Além do medo de contrair o vírus, a falta de vestígios humanos em locais antes saturados de vida nos levou a refletir sobre o caráter efêmero da vida e a impermanência das coisas, como implica essa emoção.

Uma sensação estranha que todos nós conhecemos

Esperamos encontrar atividade e movimento onde quer que formos. Mas, quando nos deparamos com uma cena sem vida, onde só existem objetos, sem qualquer presença humana, onde conseguimos ouvir os tênues sons de fundo que, se não fosse a ausência de pessoas, passariam despercebidos… é naquele momento que o vazio preocupa.

No entanto, embora possa parecer paradoxal, muitos de nós encontramos uma certa beleza no silêncio. Você já se perguntou por que as antigas ruínas da Grécia e de Roma, repletas de histórias passadas, são pontos de visitação tão frequentes? Ou por que sentimos uma atração tão poderosa por lugares abandonados? É como encontrar poesia na ausência.


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