Ler romances policiais: um estímulo para o seu cérebro

O gênero policial é cativante porque nos permite mergulhar no lado mais sombrio do ser humano. Além disso, também nos permite desenvolver habilidades reflexivas e dedutivas.
Ler romances policiais: um estímulo para o seu cérebro
Valeria Sabater

Escrito e verificado por a psicóloga Valeria Sabater.

Última atualização: 22 dezembro, 2022

Ler romances policiais é uma paixão que define milhões de leitores no mundo todo. Quando o enredo é interessante o suficiente, bem como sofisticado, desafiador e até mesmo truculento, a mente fica presa a essa história durante muito tempo. Ponderamos, refletimos, aguçamos a nossa engenhosidade e intuição, arriscamos suspeitas e até mesmo possíveis resoluções em nossa tentativa de amarrar todas as pontas soltas.

As grandes editoras estão cientes dessa predileção dos leitores, pois, na verdade, este é um fenômeno que vem acontecendo há mais de um século. De fato, embora agora tenhamos em mente figuras como Camilla Läckberg, JD Barker, Donna Leon, Dolores Redondo ou Juan Gómez-Jurado, o precursor desse gênero foi Edgar Allan Poe.

Seu personagem, Auguste Dupin, foi o primeiro a nos mergulhar no fascinante mundo da investigação e do crime na história clássica Os assassinatos da rua Morgue. Mais tarde chegaria a querida Agatha Christie, assim como Raymond Chandler, Dashiel Hammett ou Patricia Highsmith. Mas o que será que o romance noir tem para que ele se torne um “vício” para o nosso cérebro?

Os romances policiais são catárticos: permitem-nos explorar o lado mais sombrio da humanidade e das nossas sociedades.

O romance policial muitas vezes serve como um “exorcismo”. Ele permite falar sobre as injustiças da nossa sociedade.

Ler romances policiais, uma atração fatal muito benéfica

Em Os Cães de Riga, Henning Mankell disse que não há assassinos, mas sim pessoas que cometem assassinatos. Essa é provavelmente uma das razões pelas quais gostamos de ler romances policiais. Afinal, este gênero nos permite mergulhar na parte mais sombria do ser humano. Uma que mostra que, sob certas condições, todos nós poderíamos matar.

Jonathan Gottschall, estudioso da literatura e autor do interessante livro The Storytelling Animal, explica que as pessoas não conseguem resistir à tentação de gravitar em torno de mundos alternativos ao nosso. Do ponto de vista neurológico e até mesmo evolutivo, isso é algo que nos define desde sempre. Adoramos – e até mesmo precisamos – que nos contem ou leiam histórias para escaparmos temporariamente da realidade.

O romance noir nos leva a universos truculentos e dramáticos que são críveis e que poderiam acontecer. Enquanto o gênero fantástico sobrenatural brinca com o impossível, o gênero policial fala do possível inscrito em muitas das injustiças que ocorrem atualmente…

Os ganchos das tramas de assassinato: emoções à flor da pele

Na vida real, evitamos certas situações porque sabemos que são perigosas. Porém, nos livros, o autor nos leva pela mão através dos cenários mais escabrosos; aqueles em que nunca acontecerá nada conosco. Entramos também em cidades muito familiares; as mesmas que, de repente, tornam-se o contexto do desastre, do drama, da cena dantesca (e sangrenta).

Ler romances policiais nos permite experimentar todo um coquetel de emoções altamente viciantes. Há surpresa, tensão, horror, morbidez, contradição, medo e também satisfação. É possível até mesmo sentir prazer com a vingança quando acompanhamos, por exemplo, a personagem de Lisbeth Salander no universo que Stieg Larsson criou para ela.

O cérebro libera dopamina a cada trama, assim como serotonina e até mesmo endorfinas. Assim, ficamos viciados nessas tramas, mas esta é uma dependência inofensiva e saudável que sempre podemos satisfazer com um novo livro.

Nos romances policiais, o medo ou a angústia nunca são incômodos ou paralisantes. Pelo contrário, acabam sendo emocionantes.

Investigamos as motivações mais profundas das ações humanas

Se há algo que agrada a maioria dos leitores deste gênero, é explorar a maldade humana. De fato, o interesse em criminologia e assassinato é um fenômeno bem estabelecido na nossa cultura. Conforme explica JD Barker, autor de vários thrillers psicológicos, os monstros mais malignos, como os assassinos em série, geralmente levam uma vida familiar normal. Eles são, na aparência, como qualquer um de nós.

E é essa imagem que nos aterroriza e, ao mesmo tempo, desperta um interesse furtivo em nós. Além disso, ler romances policiais também pode, em alguns casos, fazer com que o vilão da trama se torne o nosso personagem favorito. Podemos pensar em Hannibal Lecter, por exemplo. No entanto, a leitura cria em nós uma rede de segurança cognitiva: podemos assim admirar o malvado sem prejuízo para a nossa própria imagem.

Mulher lendo no campo
Algo que buscamos nos romances de assassinato é entender as motivações dos criminosos.

Ler romances policiais nos permite investigar a sociedade atual

O gênero do thriller ou romance noir não é apenas um canal para investigar a maldade humana. É também um cenário ideal para mergulhar na injustiça social e na corrupção. Foi ao longo das décadas de 1960 e 1970 que muitos jornalistas saltaram para o mundo editorial a fim de denunciar e trazer à luz fatos reais que ocorriam nas sombras da sociedade.

Máfias, prostituição, pederastia, corrupção política… Muitos desses romances giram em torno de problemas bastante atuais e que são do interesse dos leitores. Além disso, estudos como o realizado na Universidade Washington and Lee nos lembram que ler livros aumenta a empatia e o comportamento pró-social. Assim, optar pelo romance noir pode até mesmo reforçar o senso de justiça.

Muitas dessas leituras que estão dentro do cânone do gênero policial são autênticos trabalhos de pesquisa feitos por seus autores. Isso gera uma grande expectativa em nós. Acima de tudo, porque sempre temos aquela sensação de que qualquer semelhança com a realidade é, de fato, real.

Permitem desenvolver uma mente crítica e reflexiva

Como negar? Depois de décadas colecionando títulos do gênero policial, desenvolve-se finalmente a perspicácia de um Hercule Poirot e o olfato de um Kurt Wallander. A estimulação mental que essas leituras proporcionam é imensa, facilitando inclusive o aprimoramento de nossa capacidade reflexiva, senso crítico, análise de pequenos detalhes e até mesmo as habilidades dedutivas e de imaginação.

Para concluir, independentemente de sermos ou não verdadeiros amantes deste tema, o mais importante é sempre ter um livro por perto. Afinal, a leitura nos salva e constrói refúgios agradáveis de onde sempre saímos ilesos e também incrivelmente enriquecidos.


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  • Johnson, Dan. (2012). Transportation into a story increases empathy, prosocial behavior, and perceptual bias toward fearful expressions. Personality and Individual Differences -Doi. 52. 10.1016/j.paid.2011.10.005.
  • Gottschall, Jonathan (2012) The Storytelling Animal: How Stories Make Us Human. Mariner Books

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