Ócio, um direito e um dever

É no ócio que permitimos que surjam facetas humanas que não estão sujeitas ao imperativo da produção. O descanso é um direito e um dever, porque nele se encontra o essencial da nossa liberdade.
Ócio, um direito e um dever
Gema Sánchez Cuevas

Escrito e verificado por a psicóloga Gema Sánchez Cuevas.

Última atualização: 08 junho, 2020

Durante muito tempo, o ócio foi visto como algo negativo. “Ele é a mãe de todos os vícios”, diziam alguns. A ideia de que o tempo livre era negativo se espalhou devido aos interesses que prevaleciam na era industrial. O slogan era produzir o máximo e, por esse motivo, esse tipo de ideologia, segundo a qual a única coisa louvável na vida era trabalhar, se tornou popular.

Produzir sempre mais para gerar mais excedentes levava a uma atividade industrial descontrolada. As consequências incluem uma destruição significativa do meio ambiente e uma redução perceptível na qualidade de vida dos trabalhadores. Esse viver apenas para trabalhar causa cada vez mais doenças físicas e mentais. Por esse motivo, o ócio começou a ser reivindicado não apenas como um direito, mas também como um dever.

“Os momentos de ócio e lazer são a melhor de todas as aquisições”.
– Sócrates –

Agora, através da ciência, sabemos que o descanso é tão fundamental quanto o trabalho. O cérebro e todo o organismo precisam de períodos de quietude para funcionar corretamente. Quem descansa com a mesma frequência com que trabalha é mais produtivo, criativo e saudável. No entanto, não fomos educados para o ócio tanto quanto para o trabalho.

Homem descansando

O ócio, um direito

Como sabemos, houve uma época em que o direito ao descanso era limitado a uma margem mínima. Não havia direitos trabalhistas, uma jornada de trabalho estabelecida nem salário mínimo legal. Os empregadores não tinham problemas em contratar funcionários por jornadas de 14 ou mais horas. Em troca, pagavam o que queriam.

Havia muitos desempregados, por isso os trabalhadores aceitavam essas condições totalmente injustas. Por sua vez, em várias partes do mundo, começaram a surgir sindicatos e organizações sindicais. Trabalhadores de todo o planeta lutaram muito para alcançar os direitos básicos e universais. Isso nos permitiu chegar ao famoso esquema dos três oitos: 8 horas de trabalho, 8 horas de descanso e 8 de vida familiar.

Em muitos países esse esquema ainda é mantido, embora as condições de semiescravidão ainda persistam em diversos lugares do planeta. O importante aqui é lembrarmos que esse é um direito conquistado com muitas lutas, que chegaram a custar várias vidas. Desistir voluntariamente de um direito significa contribuir para que ele se torne uma letra morta e, eventualmente, desapareça.

O ócio, um dever

Dar espaço para o ócio em nossas vidas é um ato de amor próprio; faz parte do autocuidado que cada um de nós deve ter. Descansar é uma responsabilidade que temos conosco se apreciamos a nossa saúde e o bem-estar. Parece uma verdade muito óbvia, mas no mundo de hoje isso foi esquecido. A internalização das obrigações é tão forte que muitas pessoas não suportam ter um tempo livre no qual não precisam prestar contas a ninguém.

Bertrand Russell, o famoso pensador inglês, lançou muitas luzes sobre o tema do ócio. Em um de seus textos, ele expõe um exemplo interessante. Ele define um cenário em que um grupo de fábricas produz todos os pinos necessários para um país, empregando 100 trabalhadores, 8 horas por dia. De repente, aparece uma tecnologia que gera a mesma produção, mas na metade do tempo. O que deveria acontecer, e o que realmente acontece?

Russell diz que, nesse caso hipotético, o que acontece é que muitos trabalhadores são demitidos, seja porque é necessária menos mão de obra ou porque algumas empresas quebram. Na sua opinião, o que deveria acontecer é que os mesmos trabalhadores e as mesmas fábricas trabalhassem apenas metade do tempo. Dessa forma, todos ganhariam, pois continuariam vendendo a mesma coisa, pelo mesmo preço.

Ócio, um direito e um dever

Proteger os momentos de descanso

Atualmente, a sociedade de consumo mudou as prioridades para muitas pessoas. Não se trabalha apenas para satisfazer adequadamente as necessidades básicas, mas para ter um excedente para consumir: comprar coisas, sejam necessárias ou não. Substituir os seus bens constantemente, estar sempre comprando e pagando.

É por isso que, de bom grado, muitos concordam em trabalhar mais do que o razoável. Eles precisam de mais dinheiro porque o mercado é insaciável. Sempre haverá uma oferta mais tentadora que a outra. Quem tem roupas quer roupas novas, quem tem uma casa quer uma maior, quem tem carro quer um avião.

O consumo, por sua vez, gera um estilo de vida fechado. Você trabalha para consumir e consome para trabalhar. O tempo livre é usado para as compras ou para o consumo. Pensar no tempo livre às vezes não faz sentido para muitos. De fato, isso os incomoda.

No entanto, isso não é algo saudável. É importante valorizar os nossos momentos de ócio, porque é neles que entramos em contato com o mais verdadeiro de nós mesmos e da vida.


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  • Pieper, J. (1998). El ocio y la vida intelectual. Ediciones Rialp.


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