Posvenção: quando a prevenção falha

E se a prevenção do suicídio falhar? Em que consiste a posvenção após uma morte por suicídio? Saiba mais sobre o assunto e a sua importância neste artigo.
Posvenção: quando a prevenção falha

Última atualização: 09 agosto, 2020

O comportamento suicida é um fenômeno complexo, influenciado por fatores psicológicos, biológicos, sociais, culturais e ambientais, que podem afetar pessoas de qualquer idade, gênero, cultura ou grupo social. Essa natureza multicausal implica que, para a prevenção, é necessária uma abordagem sistêmica e transversal. No entanto, quando a prevenção falha, temos que começar a falar sobre a posvenção.

A posvenção consiste em oferecer apoio à família e ambiente próximo das pessoas que morreram por suicídio. Esse processo é tão ou mais importante do que a prevenção. As pessoas próximas podem ter sentimentos de ambivalência por causa do forte estigma em torno do suicídio.

O suicídio é a principal causa de morte não natural, acima das mortes por acidentes de trânsito. A OMS informa que ocorrem cerca de um milhão de mortes por suicídio por ano e prevê que, até este ano de 2020, a taxa possa aumentar para um milhão e meio. É mais comum que os homens cometam suicídio, enquanto as mulheres fazem o dobro de tentativas.

Mulher sofrendo de depressão

Prevenção do suicídio

É importante lembrar que, ao longo dos anos, algumas estratégias foram adotadas no campo da saúde com o intuito de prevenir o suicídio, especialmente após o ano 2000. Manuais direcionados a profissionais de saúde mental, atenção básica, mídia, educação e conselheiros foram lançados pelo Ministério da Saúde, seguindo inclusive os direcionamentos da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

Na presença da ideação suicida, é importante que a pessoa recorra sem vergonha a alguém em quem confie, com quem possa compartilhar o que está acontecendo, e que se permita ser ajudada. Também é necessário procurar profissionais que possam realizar a intervenção apropriada.

Lembre-se de que o suicídio é uma solução permanente para um problema ou problemas que são, na maioria das vezes, temporários. Por outro lado, o fato de não encontrar uma solução não significa que ela não existe, que no momento seguinte não possa ser encontrada.

“O suicídio é uma solução eterna para o que geralmente é apenas um problema temporário”.
-Edwin Schneidman-

Como ajudar alguém que pensa em suicídio

Podemos ajudar a pessoa a identificar as situações desencadeantes das crises; isto é, a identificar a causa dos pensamentos suicidas com o objetivo de reconhecer quando uma crise pode ocorrer.

A elaboração de uma espécie de “plano de segurança” pela pessoa afetada, com ou sem a ajuda de um amigo próximo ou de um profissional, pode ajudar a reduzir a probabilidade de cometer uma tentativa de suicídio. Este plano pode conter os seguintes pontos (para fins de orientação):

  • Sinais de alarme.
  • Apoios: nomes de pessoas de confiança, juntamente com seus dados de contato, para que possam ser chamados em uma emergência ou tentativa de suicídio iminente.
  • Pontos de ancoragem: pessoas ou razões pelas quais vale a pena continuar vivendo.
  • Diretrizes de proteção: busca de soluções não suicidas, eliminação de objetos com os quais possam se ferir.
  • Lista de números de telefone para serviços de atendimento 24 horas.
  • Lembrete para ligar para o 188, Centro de Valorização da Vida (CVV) ou ir para a emergência do hospital mais próximo, caso as prevenções anteriores não funcionem e o risco seja iminente.

E quando tudo falha? Tem início a posvenção

Como já mencionamos, a posvenção consiste em oferecer apoio social, psicológico e institucional a pessoas próximas de alguém que morreu por suicídio. Essas pessoas devem ser ajudadas na elaboração de um luto saudável e a abordar os fatores de risco de um processo de luto complicado.

O processo de luto é diferente para cada pessoa e o luto por suicídio é muito diferente de qualquer outro tipo de luto. Não há reações “certas” ou “erradas” e qualquer sentimento é normal e aceitável (choque, negação, culpa, dor, vergonha…).

É comum que, após a morte, comecem a aparecer os “por quês” (Por que ele fez isso? Por que eu não o ajudei?…) e os “e se” (e se eu tivesse notado? e se ele tivesse procurado ajuda?…).

À medida que o processo de luto avança, começa a ser entendido que, embora o suicídio possa ser evitado em alguns casos, em outros todas as medidas preventivas são inúteis e insuficientes. O resultado não depende das pessoas próximas. É preciso entender que nem todas as perguntas têm respostas e que, muitas vezes, os motivos não serão esclarecidos.

A aceitação é a melhor maneira de integrar a perda. Por mais difícil que possa parecer, a decisão do falecido deve ser respeitada e ele não deve ser mais responsabilizado pelo sofrimento causado. Ele deve ser perdoado e o próprio ambiente também. No entanto, os sentimentos de culpa podem persistir, apesar da aceitação da perda e do perdão ao falecido.

Sessão de terapia

Derrubando mitos sobre o suicídio: estratégia básica na fase de posvenção

O suicídio está cercado por mitos e é um assunto tabu. Por esse motivo, muitas vezes a família e os amigos de uma pessoa que cometeu suicídio ficam envolvidos em sentimentos ambivalentes. Juntamente com a tristeza, pode aparecer a raiva. A vergonha é um sentimento comum, que muitas vezes leva a esconder a verdadeira causa da morte por medo de julgamento social.

É importante que a posvenção inclua estratégias de apoio psicossocial e de psicoeducação. Essas seriam estratégias relacionadas às reações e sentimentos que podem ser vivenciados durante o processo de luto e como combater as críticas sociais. É necessário que a família e o ambiente saibam que eles têm todo o direito de manter silêncio, se assim desejarem.

Acima de tudo, derrubar certos mitos pode ajudar a reduzir o medo de julgamento e a ambivalência.

Alguns desses equívocos são:

  • Falar sobre suicídio gera um fator de atração.
  • O suicídio não pode ser evitado porque a pessoa quer morrer.
  • O suicídio é um ato covarde/é um ato muito corajoso.
  • As pessoas que cometem suicídio o fazem para atrair atenção.
  • Quem quer se matar não fala sobre isso.

Uma pessoa que quer cometer suicídio ou realiza uma tentativa de suicídio é alguém que precisa e merece ajuda, assim como as pessoas ao seu redor. Não devemos esquecê-los, porque se um processo de luto é difícil e doloroso por definição, o processo de luto por suicídio é ainda mais. Muitas vezes, é acompanhado por sentimentos de culpa e vergonha que podem ser muito duradouros e resistentes a intervenções.

Além disso, um luto que não é elaborado corretamente pode ser muito complicado. Pode até derivar em um transtorno depressivo se você não tiver o apoio e os recursos necessários.

Portanto, é importante não apenas focar na prevenção do suicídio, mas também na posvenção e educação da sociedade, para acabar com o estigma que tanto castiga o entorno do falecido.


Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.