Carta ao meu corpo

Carta ao meu corpo

Última atualização: 23 agosto, 2016

Querido corpo,

Faz tempo que não nos falamos e sinto saudades suas. Que sensação mais estranha voltar a conversar com você, como se você fosse um velho amigo que faz tempo que não visito. Como se sentisse falta do seu contato e quisesse vê-lo apressadamente através destas linhas.

A vida passa tão depressa que me falta tempo para estar com você de forma consciente. Se você está aí, saiba que lhe devo cada movimento e cada pensamento, e que ainda assim, às vezes o sinto distante, como se a minha mente funcionasse sozinha, como se não houvesse um corpo físico dando-lhe suporte.

Não o culpo por isso, porque somos um só. Sou eu, e portanto você, o responsável por fazer de surdo quando você grita o meu nome agitadamente. Somos nós que não paramos até chegarmos ao limite para voltar a nos olharmos mutuamente.

Embora às vezes alheio, eu sinto você

Mas não pense que não escuto, que estes gritos não chegam aos meus ouvidos, porque não é verdade. Eu ouço e sinto, mas às vezes o ignoro. Não me culpe por isso, sei que muitas vezes você fez o mesmo comigo. Ambos conhecemos a frustração de falar sem sermos ouvidos.

Suas mensagens, que vão do sutil ao grotesco, captam a minha atenção quando eu quero que sejam atendidas. Mesmo com você marcando o ritmo, sou eu que terei a última palavra para decidir o momento e o lugar adequados para que estejamos juntos.

Eu sei que isso deixa-o angustiado. Sei que você quer mais e, mesmo que você trate de me enganar dizendo o contrário, eu também quero mais. Anseio pelo momento de estar a sós com você, mas um de nós tem que impor os limites nessa relação.

Mãos juntas representando união do corpo

Há um momento e um lugar para você

Não se desespere, embora às vezes seja difícil nos entendermos, não somos nada um sem o outro, e só podemos chegar ao topo se estivermos juntos. Não me abandone no caminho, pois sem mim você fica vazio, e sem você, fico inerte. É difícil marcar um encontro com você, minha agenda está sempre apertada, mas você, de paciência infinita, espera ao meu lado que o ponteiro do relógio deixe, entre seu tic e tac, um espaço para que a sua voz ressoe.

Embora seja difícil, o momento acaba chegando. Procuramos esse momento como quem procura uma agulha em um palheiro e acaba encontrando depois de um trabalho árduo. Desfrutando do momento, sabendo que chegou a hora e que o ponteiro voltou ao seu lugar, ali onde pertence, e não se perde em um monte de palha.

Se você olha para mim, eu olho para você

E quando chega a hora e finalmente estamos sozinhos, é quando começamos a ser nós mesmos. Você tira a roupa e fica descoberto enquanto eu tiro os pensamentos que cobrem a minha cabeça hora após hora. Só estamos você e eu. Nus e sem proteções que interrompam a nossa comunicação. Se você fala comigo, eu respondo. Se você olha para mim, eu olho para você. Por fim, sinto-o em todo o seu esplendor.

Desde o toque suave do seu pescoço até as cócegas na panturrilha que perturbam um mar em calma, não há uma única parte de você que eu queira perder agora, e mesmo o menor canto parece digno de ser explorado, como se fosse a primeira vez.

Mulher loira pensando em seu corpo

Quando estamos juntos, somos grandes

Assim como a erupção é para o vulcão, você é a minha vida. Primeiro em calma, que tudo parece tranquilo. Temos tempo para parar em todos os vales que encontramos e, juntos, desfrutar o que os nossos sentidos nos oferecem.

Os ruídos e o aumento da temperatura nos indicarão que há atividade, que o vulcão está vivo e que a calma aparente era só uma miragem. O calor e o movimento da terra cada vez mais urgente nos alertam da chegada iminente da explosão que irá transformar a rocha em lava.

Porque quando falamos, nos entendemos, e quando isso acontece, o resultado é quase mágico. Como a imagem de um corpo e uma mente em plenitude, como a cena de um vulcão em erupção. E é que quando estamos juntos, somos grandes e podemos conseguir o que cada um não era capaz de fazer sozinho.

Querido corpo, o prazer foi meu

Querido corpo, não posso prometer que irei escrever com mais frequência, nem mesmo que vou parar de ignorá-lo. Vamos continuar a nos perder no “quero e não posso”, e no “hoje posso mas não quero”.

Mas vai chegar um momento em que vamos voltar a olhar e a ouvir um ao outro. Talvez, depois destas palavras, isso aconteça mais cedo do que tarde e que, sem percebermos, voltaremos a estar unidos de novo sob a mesma consciência.

Não há necessidade de me agradecer por essas linhas, o prazer foi meu.

Mulher com flores tatuadas no corpo

Este texto é fornecido apenas para fins informativos e não substitui a consulta com um profissional. Em caso de dúvida, consulte o seu especialista.