Esquizotipia e criatividade: um nexo curioso

O que é esquizotipia, como se relaciona com delírios, experiências espirituais ou criatividade? Nós lhe contamos mais sobre isso!
Esquizotipia e criatividade: um nexo curioso
Gorka Jiménez Pajares

Escrito e verificado por o psicólogo Gorka Jiménez Pajares.

Última atualização: 01 março, 2023

Existem vários fatores que a pesquisa associou à criatividade. Uma delas é a esquizotipia, quando, paradoxalmente, tem sido considerada um traço de personalidade mórbido, patológico e até sombrio. Hoje sabe-se que os portadores desse recurso são mais criativos em relação aos demais.

Além disso, poderíamos falar de dois tipos de esquizotipia. A esquizotipia maligna aumenta o risco de transtornos psicóticos. Caracteriza-se pelo que Amparo Belloch (2020) chama de “superinclusão cognitiva”, termo que faz alusão à desorganização do pensamento e à impossibilidade de usufruir de convívios sociais.

Pelo contrário, a esquizotipia positiva tem sido associada à criatividade e outros processos mentais, como o aumento da percepção de “experiências paranormais” (Parra, 2015). No entanto, essas pessoas são capazes de administrar e lidar de forma adaptativa com suas percepções inusitadas, transformando-as e sublimando-as em criações artísticas e técnico-científicas.

“A criatividade é a inteligência se divertindo”.

-Albert Einstein-

Homem criativo olhando alguns pincéis

O que é esquizotipia?

Para Claridge (Belloch, 2020), esse traço caracteriza sujeitos capazes de captar experiências de vida inusitadas. Assim, o pensamento dessas pessoas é caracterizado pela desorganização, sendo tanto pessoas muito inconformistas quanto impulsivas.

Essa característica, por si só, não tem o potencial de levar uma pessoa a desenvolver psicose. Embora a esquizotipia possa desgastar e corroer a saúde mental, sua parte mais gentil e benevolente está intensamente relacionada à criatividade. Nesse sentido, a esquizotipia benigna tem sido associada a habilidades artísticas, criativas e científicas (Belloch, 2020).

Dessa forma, dependendo de como esse traço influencia o cotidiano das pessoas, a esquizotipia será benéfica ou prejudicial. No pólo positivo, a esquizotipia seria uma forma de funcionamento adaptativo que beira a psicose, sem de fato desencadear o quadro.

“Ser um gênio realmente significa pouco mais do que ter a capacidade de perceber as coisas de uma maneira diferente.”

-William James-

Qual é a relação entre esquizotipia e criatividade?

Devemos atender a um componente: anedonia. Esse termo se refere à pouca capacidade de desfrutar das coisas que proporcionam prazer no cotidiano das pessoas.

Assim, a anedonia, como componente da esquizotipia, pode ser considerada um elemento diferenciador. É o componente que indica um risco potencial de erosão na saúde mental, e estaria ausente em pessoas com esquizotipia positiva (Parra, 2015).

A anedonia é o componente ou fator potencialmente capaz de diferenciar sujeitos saudáveis e criativos de sujeitos com psicose. As pessoas com pontuação alta em esquizotipia e baixa em anedonia são capazes de canalizar de maneira saudável esse fator de seu caráter por meio da inovação. Ou seja, eles são mais criativos.

“A anedonia foi encontrada, com base em uma amostra de artistas e poetas criativos, correlacionada negativamente com a criatividade.”

-Alejandro Parra-

Experiências espirituais

Além da ausência de anedonia, existe outro elo entre esquizotipia e criatividade: a percepção de experiências espirituais. Dentro deste tipo de percepções podemos encontrar o “sentir-se transcendente”, o “ser cósmico”, a “experiência de fusão com o oceano”, o “sentir-se à vontade com o místico”,  “perceber acontecimentos sobrenaturais” e, em última instância, se sentir em contato com “algo superior”.

Dentre todas elas, a experiência que mais se vincula à esquizotipia é a de “conhecer-se acompanhado de uma entidade espiritual” (Parra, 2012). Apesar da raridade das crenças, pensamentos ou experiências que descrevemos, as evidências científicas indicam que elas são normalmente positivas para a saúde mental das pessoas.

“Essas experiências são tipicamente raras, emocionalmente positivas e profundamente significativas para o indivíduo”.

-Alejandro Parra-

Mulher com luz em sua mente

Qual é a relação entre essas experiências e a criatividade?

A resposta pode ser encontrada nas consequências de perceber o mundo dessa maneira. Assim, essas pessoas tendem a se sentir mais gentis, sábias e humildes em comparação com o restante da população. São estas diferenças que poderiam estar ligadas à criatividade.

Neste sentido, foi postulado que a esquizotipia poderia ser uma vantagem adaptativa. Desta forma, a esquizotipia positiva poderia ser concebida como uma organização de crenças idiossincráticas que oferece proteção contra percepções estranhas, ao mesmo tempo em que permite aos sujeitos que carregam este traço utilizar estas percepções para produzir belas obras poéticas, literárias ou musicais, entre outras.

Durante anos, as pessoas quiseram vincular a doença mental à criatividade por meio de declarações certamente pejorativas, como “só os loucos são capazes de realizar grandes obras”. No entanto, como podemos ver, é um componente específico, a esquizotipia, que parece estar por trás de algumas das mais belas criações que desfrutamos todos os dias.

“Tem sido sugerido que a verdadeira relação está entre a personalidade esquizotípica e a criatividade, entendendo-se a esquizotipia como um continuum entre a normalidade e a esquizofrenia.”

-Patricia Mora-


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  • Belloch, A. (2023). Manual de psicopatología, vol II.
  • Garnica, P. M., Jiménez, M. J. C., & Quirós, F. C. CREATIVIDAD Y ESQUIZOFRENIA.
  • Parra, A. (2015). Marco referencial de las creencias y experiencias paranormales y su relación con la esquizotipia positiva/negativa. Persona, (18), 123-135.
  • Parra, A. (2012). Experiencias perceptuales inusuales, experiencias anómalo/paranormales y propensión a la esquizotipia. Universitas Psychologica, 11(1), 269-278.
  • Claridge, G. E. (1997). Schizotypy: Implications for illness and health. Oxford University Press.
  • Claridge, G. (1999). Esquizotipia: teoría y medición. Rev. argent. clín. psicol, 35-51.

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