Memória autobiográfica, as recordações maravilhosas das nossas experiências
A lembrança do nosso primeiro amigo de infância, o cheiro de que mais gostamos, quem éramos e como aproveitávamos a vida são questões inerentes à memória autobiográfica. Você consegue se imaginar esquecendo quem são as pessoas mais próximas a você? Como foi o seu primeiro beijo? Ou quais foram os seus lugares favoritos?
Hoje vamos falar sobre esse tipo de memória. Para começar, vamos dizer do que se trata. Posteriormente, falaremos sobre a sua divisão. Também mergulharemos em seu relacionamento com a consciência. Finalmente, veremos algumas pesquisas atuais que nos fornecem luz para encontrar um tratamento alternativo e a cura para a doença de Alzheimer.
“A memória é o perfume da alma.”
-George Sand-
O que é a memória autobiográfica?
A memória autobiográfica é aquela que se relaciona com as experiências pessoais. Consiste nas memórias que temos sobre a nossa vida. Além disso, é o suporte da nossa biografia, já que atua como organizadora das nossas experiências.
Essa memória resulta da interação que temos com o mundo e é definida pelo que fazemos. Segundo José María Ruiz-Vargas, professor e pesquisador da faculdade de psicologia da Universidade Autônoma de Madri, as memórias autobiográficas são caracterizadas por:
- A relação com o eu. As memórias contêm informações que ajudam a estruturá-lo e defini-lo.
- Estrutura narrativa. Quando evocamos experiências pessoais do passado, o fazemos contando uma história. Então, “a experiência se torna uma narrativa através da recuperação” (Ruiz-Vargas, 2004, p.10).
- Imagens mentais. Memórias autobiográficas são evocadas incluindo imagens visuais e outras modalidades sensoriais, como audição e olfato.
- Componente emocional. As emoções podem chegar a exercer um efeito fortalecedor nas memórias.
A memória autobiográfica também tem a ver com uma distribuição temporal. A disponibilidade do passado pessoal não ocorre de maneira uniforme, varia em cada um e também de acordo com a etapa do ciclo da vida em que nos encontramos.
Divisões
A memória autobiográfica engloba dois elementos:
- Memória autobiográfica episódica. Tem a ver com as memórias do próprio passado, ou seja, com aquelas associadas a experiências pessoais que aconteceram em um determinado lugar e tempo.
- Memória autobiográfica semântica. São memórias associadas a eventos que ocorrem repetidamente e a experiências passadas que abrangem longos períodos de tempo vividos.
Alguns exemplos de memórias autobiográficas episódicas são os seguintes: “Me recordo daquele dia em que mergulhei e vi uma tartaruga pela primeira vez”, ou “Me lembro de quando fui hospitalizado devido à depressão”. Por outro lado, uma das memórias autobiográficas semânticas seria: “Quando eu era criança, costumava visitar minha avó todos os sábados.”
Se analisarmos os dois tipos de memória, veremos que a memória autobiográfica episódica está relacionada a um tempo subjetivo, permitindo-nos reviver experiências anteriores por meio de uma consciência autonoética; isto é, permitindo-nos ter a sensação de estarmos vivendo nossas memórias, como uma espécie de viagem mental no tempo. Em contraste, a memória autobiográfica semântica leva a uma consciência limitada do senso de familiaridade.
Memória autobiográfica na atualidade
A memória autobiográfica continua a ser uma área bastante explorada atualmente. Acima de tudo, é associada a doenças neurodegenerativas e transtorno de estresse pós-traumático. Vamos nos aprofundar na Doença de Alzheimer (DA).
A memória autobiográfica vai sofrendo um declínio na doença de Alzheimer. O curioso é que várias pesquisas verificaram que isso ocorre de forma diferente dependendo do tipo e do envelhecimento normal e patológico.
Portanto, quando as pessoas se lembram do seu passado, demonstram um pensamento associado à memória episódica. A produção dessas memórias é baixa se comparada às semânticas. Pessoas com DA têm pouca capacidade de se lembrar de momentos autobiográficos episódicos.
Para estudar a memória autobiográfica na DA, alguns especialistas recorreram a experimentos por meio da reminiscência, ou seja, da evocação de memórias.
Por exemplo, El haj, Fasotti & Allain (2012), no artigo publicado na Consciouness and Cognition Magazine, mostram como examinaram o caráter involuntário das memórias autobiográficas evocadas pela música. Outros autores enfatizam a evocação de memórias, mas através de imagens, vídeos e até cheiros.
Em suma, a memória autobiográfica está intimamente ligada a quem somos, pois diz respeito às nossas experiências de forma geral e detalhada. A forma como as memórias autobiográficas são evocadas no envelhecimento normal e patológico é diferente.
Além disso, as pessoas com DA apresentam uma perda progressiva da memória autobiográfica episódica. Vários estudos continuam a explorar este tipo de memória, e esperamos que eles continuem a abrir caminho para que possamos compreendê-la melhor tanto no funcionamento normal quanto no patológico.
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Ruiz-Vargas, J.M. (2004)- Clavers de la memoria autobiográfica. En Autobiografía en España: un balance: acta del congreso internacional celebrado en la Facultad de Filosofía y Letras de Córdoba.