O "debriefing" psicológico, é realmente útil?

No imaginário coletivo, quando uma pessoa experimenta um acontecimento altamente traumático e angustiante, há uma tendência para pensar que "é melhor falar sobre isso o mais depressa possível". No entanto, as provas científicas sugerem que isto poderia ser contraproducente. Por quê? Vamos descobri-lo neste artigo.
O "debriefing" psicológico, é realmente útil?
Gorka Jiménez Pajares

Escrito e verificado por o psicólogo Gorka Jiménez Pajares.

Última atualização: 19 abril, 2023

O debriefing psicológico é uma estratégia com aparente potencial terapêutico; é frequentemente usado para a prevenção de entidades clínicas relacionadas ao estresse. Alguns autores o consideram uma forma de terapia. No entanto, o método (chamado de ‘interrogatório’ em inglês) é mais uma estratégia de apoio à crise do que um protocolo consolidado de tratamento psicológico.

Essa estratégia não é isenta de críticas porque, como veremos adiante, ela tem o poder de realimentar o estresse e aumentar o trauma em pessoas que sofreram eventos angustiantes. A seguir, vamos explicar a técnica que nasceu nos anos 70, pela mão de JT Mitchel, sob o nome de ” Critical Incident Stress Debriefing, CISD”.

“Os dados disponíveis fornecem pistas sobre possíveis efeitos nocivos, como retraumatização ou o risco de acesso tardio a outras intervenções.”

-Eduardo Fonseca Pedrero-

O que é debriefing psicológico?

O objetivo dessa modalidade é diminuir as consequências psicológicas de eventos potencialmente traumáticos. É estruturado, ou seja, contempla uma série de fases bem definidas que veremos a seguir (Fonseca-Pedrero et al, 2021):

  1. Introdução. O grupo recebe informações sobre como funciona o debriefing, promovendo o diálogo ou a narração de aspectos do evento. Após a apresentação de cada componente, avaliam-se as expectativas que as pessoas têm sobre esta estratégia, de forma a ajustá-las caso sejam elevadas.
  2. Narrativa de eventos. Para isso, são feitas diferentes perguntas aos participantes, como “o que aconteceu?”, “como você vivenciou isso?”, “como isso aconteceu” ou “como você se sentiu?”.
  3. Compartilhar pensamentos e reações em torno do evento traumático. O objetivo desta fase é duplo, pois procura promover a compreensão das reações ao evento, ao mesmo tempo em que tenta facilitar a rotulação das emoções que surgiram como resultado.
  4. Analise as reações emocionais. Nesta fase, busca-se a ventilação emocional do medo, da raiva e da frustração, com o objetivo de que os membros do grupo se apoiem e confortem uns aos outros.
  5. Normalizar. Busca validar as reações, tanto emocionais quanto comportamentais, ao evento estressante.
  6. Planejar o futuro e encarar o presente. Pretende-se que, após a intervenção, as pessoas do grupo terapêutico possam antecipar os sintomas que irão ocorrer nos próximos dias, como a insónia ou memórias intrusivas.
  7. Dissolução do grupo. Nesta fase, os participantes são convidados a fazer quantas perguntas forem necessárias. Em seguida, são informados sobre outros recursos assistenciais e profissionais a que recorrer caso julguem necessário, como o hospital.

Entre os objetivos perseguidos por meio do debriefing psicológico está o alívio precoce do estresse pós-evento. Procura também promover a identificação, rotulação e descrição das experiências emocionais vividas e das reações e pensamentos que se têm. No entanto, apesar das boas intenções dessa estratégia, ela pode ser prejudicial se mal utilizada.

“As pessoas expostas a um evento traumático devem receber terapia psicológica como primeira medida, mesmo antes da medicação ou do debriefing”.

-Eduardo Fonseca-Pedrero-

Soldado com bastão na mão está em consulta com psicólogo
Seja como terapia ou estratégia de apoio à crise, o debriefing deve dar espaço para a pessoa decidir quando falar.

Quais são as críticas?

Podemos pensar que a vítima de um assalto, um ataque, um desastre natural (em suma, um evento potencialmente traumático ) encontraria alívio “desabafando verbalmente suas emoções”. Mas pode ser contraproducente, porque embora a “desabafo verbal” do que aconteceu, com o objetivo de prevenir o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), seja útil por 24 a 72 horas após o evento, se for feito muito em breve pode causar o efeito oposto. Há evidências científicas para apoiá-lo.

Uma memória leva em média cerca de 6 horas para se consolidar na memória. Para que ocorra a consolidação, o ideal é estar relaxado e, se possível, dormindo. Para prevenir o TEPT, é importante que a pessoa permaneça ocupada e ativa, em vez de relaxada e dormindo por seis horas após o evento.

O objetivo é manter a vítima longe da “janela de consolidação de memória”. Nesse sentido, recomenda-se, mesmo com alguma prudência, abster-se da prescrição de drogas hipnóticas durante a primeira noite após o trauma.

Fazer uso do debriefing antes de 24 horas após o evento pode ter um efeito retraumatizante. Isso porque poderia reforçar a consolidação da memória do evento na memória. Em outras palavras, é importante “dar tempo para a pessoa digerir o que aconteceu”.

“Os dados disponíveis fornecem pistas sobre possíveis efeitos nocivos, como retraumatização ou o risco de acesso tardio a outras intervenções.”

-Eduardo Fonseca-Pedrero-

Mulher em terapia psicológica recebendo apoio do especialista
Além de compreender o acontecimento pelo qual alguém passou, a técnica promove a nomeação das emoções derivadas dele.

O debriefing psicológico é realmente útil?

O debriefing psicológico pode ser útil quando utilizado, dentro de uma estratégia terapêutica grupal, entre 72 horas e 14 dias após o evento. Além disso, é importante permitir que a vítima escolha se quer “desabafar” suas emoções e lembranças ou se prefere ficar em silêncio.

Como vimos, o debriefing psicológico tem o potencial de ter efeitos traumáticos em pessoas que foram submetidas a eventos estressantes. Apesar de esta estratégia ter nascido com as melhores intenções, a investigação em neurociências e os resultados de eficácia e eficácia tendem a desaconselhá-la (Fonseca-Pedrero et al, 2021).

“De acordo com os níveis de evidência estabelecidos em diferentes diretrizes, por exemplo, o NICE, não deveria ser uma prática clínica de rotina, devido à sua falta de eficácia e eficácia.”

-Eduardo Fonseca-Pedrero-


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