Slow Living, outra maneira de ser feliz
Quantas vezes já nos vimos embolados no redemoinho criado pela velocidade do mundo? Quase todos nós já nos sentimos assim. Viver em ritmo frenético faz com que percamos momentos, nuances, sensações, detalhes… Detalhes estes que, muitas vezes, fazem toda a diferença. Nos anos 80, surgiu o movimento slow living, ou “viver lentamente”, e existem cada vez mais pessoas que optam por seguir esta filosofia de vida. O que esse movimento prega e quais benefícios ele pode nos trazer? É sobre isso que falaremos a seguir.
Infelizmente, na nossa cultura, a palavra “lento” pode ter conotações negativas, sendo equiparada a termos como “desocupado” ou “preguiçoso”. Nossa intenção é quebrar esta associação. Viver lentamente não significa viver mal, nem viver de maneira irresponsável, mas sim viver prestando atenção ao momento presente, desfrutando de cada momento.
Vivemos rápido, muito rápido, e não nos damos conta disso. Não por acaso, o Brasil é o país mais ansioso do mundo. Pessoas que sofrem com um estresse elevado acabam desenvolvendo transtornos emocionais como a ansiedade e a depressão. Isso ocorre porque, quando nos damos conta do nosso sofrimento, já é tarde.
“Não existe ordem no mundo que nos cerca, e devemos nos adaptar ao caos.”
-Kurt Vonnegut-
Viver em um ritmo frenético tem consequências
Conforme crescemos, aprendemos o que é a pressa e a assumimos como uma bandeira. Aprendemos a correr para chegar na escola e a entrar correndo pelo pátio para não chegar atrasado na aula; a sair correndo para as atividades extra-curriculares e a sair mais rápido ainda para chegar em casa e fazer nossos deveres. Tudo correndo. Tomamos banhos express, jantamos em dois minutos e pulamos na cama, pois o amanhã trará mais do mesmo.
O mesmo acontece quando chegamos na Universidade e quando entramos no mercado de trabalho. Nos preparamos para que a vida se torne “aquilo que acontece entre nossas horas de trabalho”. Trabalho no qual chegamos correndo e do qual saímos da mesma forma, pois, definitivamente, temos algo nos esperando em casa — seja uma família da qual devemos cuidar, relatórios que devemos preencher ou roupas que devemos estender.
Você já ouviu falar da síndrome do sapo fervido? Ela pode nos ajudar a explicar as razões que nos levam a normalizar o estresse. Se colocássemos um sapo em uma panela com água fervendo, o sapo pularia freneticamente para tentar escapar.
Entretanto, quando colocamos o sapo dentro da água em temperatura ambiente e a aumentamos gradualmente, o sapo vai adaptando sua temperatura corporal conforme a água esquenta; eventualmente, ele acaba morrendo fervido sem se dar conta do que aconteceu.
Pode até soar trágico, mas algo parecido acontece conosco. Desde crianças, nos vemos inseridos em um mundo e em uma sociedade na qual praticamente todos marcham num ritmo tão rápido que chega a ser antinatural. Porém, vamos nos adaptando como o sapo, à medida que os anos vão passando, normalizando a situação.
O mais alarmante é que chegamos a considerar o estresse como algo positivo, pois quando estamos sem ele, ficamos entediados. Quando finalmente nos damos conta de como viver no modo sprint nos afeta, já é tarde e já temos graves problemas por causa disso.
“A vida é o que acontece enquanto estamos ocupados fazendo outros planos.”
-Allen Saunders-
O que a filosofia do slow living propõe e quais são os seus benefícios?
O movimento lento engloba quase todos os aspectos da vida, desde a alimentação (slow food, a origem de tudo), até o sexo ou a educação, passando por aspectos como o exercício, o ócio, as viagens, a moda e, é claro, o trabalho.
Quando nos permitimos comer alimentos naturais praticando o mindful eating, quando utilizamos as tecnologias de maneira racional e prática, quando favorecemos o comércio local e rompemos com o ciclo de comprar-usar-e-largar nossas roupas (isso influencia toda a cadeia produtiva).
Esse estilo de vida propõe viver com calma. Isto faz com que você desfrute das coisas e dê a elas a atenção que merecem. O que tem mais valor? Fazer algo correndo ou dedicar mais tempo, colocando toda a nossa consciência na atividade?
Sei que na teoria é fácil. Por isso, o movimento slow living dá uma série de recomendações para começar a “viver lentamente”. A primeira é: tenha paciência. Ninguém muda todo um sistema de vida em um único dia.
Entregue-se ao slow living
Levante-se alguns minutos antes. Isso compensa! Tome banho e café com calma, evite chegar sem fôlego ao trabalho ou local de estudo. Se possível, vá caminhando enquanto presta atenção à caminhada. Se precisar usar o transporte público, não fique se distraindo no celular.
Viva com menos. Fuja do consumismo e compre somente o que for preciso. Certamente, se você parar por um momento e olhar ao seu redor, perceberá que não precisamos de mais, e sim de menos. Você pode colocar em prática a regra dos 7 dias: quando quiser comprar algo que considere necessário, espere 7 dias; uma vez passado este período, caso a necessidade permaneça, compre. Este tempo também servirá como uma oportunidade para analisar outras opções e comparar preços.
Aproveite o presente. Vivemos atormentados pelo passado que não podemos mudar e temos medo de um futuro sobre o qual não temos certeza alguma. Por isso, o presente é tudo que temos e, diante disso, não deveríamos deixá-lo passar. Esta forma de viver convida à meditação e à prática de yoga, além de outras disciplinas que favorecem a conexão mente-corpo e que têm como lema o “aqui e agora”.
Esforce-se todos os dias para fazer algo bom para alguém. Ao contrário do que podemos pensar, este feito pode ser mais positivo para nós mesmos do que para a pessoa que recebe o gesto. Pouco a pouco, isso se tornará automático.
Faça parte de um grupo ou comunidade. Voluntariado, esportes em equipe, viagens… Somos seres sociais e, como estudado por Tajfel, a identidade social é condicionada pelo pertencimento a determinados grupos. Além disto, o autoconceito é condicionado pela significação e valor emocional de pertencer a certos grupos.
Escreva um diário de gratidão. Dedique um momento do dia para escrever três aspectos positivos. Podem ser ações, pensamentos, sentimentos ou acontecimentos. A princípio, você pode até se surpreender se não conseguir encontrar três coisas positivas, mas, pouco a pouco, aprenderá a apreciar as pequenas coisas e a ser capaz de criá-las por conta própria.
Parece uma coisa sem importância, mas escreva. Os pensamentos acabam sendo substituídos por outros que consideramos mais importantes. Escrever é uma maneira de lhes dar forma e podemos, inclusive, recorrer a eles em dias nebulosos. Esta é uma técnica trabalhada com pacientes depressivos, que se surpreendem com os benefícios de mudar a sua mentalidade. Confie e comprove!
Desconecte-se. Este é o ponto mais difícil. Coloque o celular no silencioso, saia na rua sem ele e, se possível, desligue-o. Você não imagina como é se sentir livre da tecnologia.
“A felicidade não está em outro lugar que não aqui; não está em outra hora que não agora.”
-Walt Whitman-
Como praticar o slow living em uma cidade?
Você verá que é muito fácil realizar as atividades anteriores em quase qualquer lugar. No entanto, a coisa não para por aí… Por mais incrível e impossível que pareça, existem cidades slow em todo o planeta.
São cidades nas quais as pessoas aproveitam passeios, bate-papos… Abaixo, listamos algumas delas ao redor do mundo:
- Pijao (Colômbia)
- Sonoma (EUA)
- Naramata (Canadá)
- Viana do Castelo (Portugal)
- Begur (Espanha)
- Loix (França)
- Michelstadt (Alemanha)
- Songbai (China)
- Kesennuma (Japão)
- Matakana (Nova Zelândia)
Estas cidades promovem o turismo lento, respeitoso e com baixo impacto ao meio ambiente. Priorizam atividades turísticas respeitosas à natureza, à cultura, à sociedade e aos valores de cada comunidade.
Como este movimento nasceu?
O movimento surgiu em 1986, na Itália, fundado por Carlo Petrini diante do seu espanto ao ver um McDonald’s na Plaza de España, em Roma.
Ele encabeçou o movimento contra o fast food e fundou a filosofia slow food, com a qual buscava proteger as tradições culinárias locais, seus produtos e o prazer gastronômico. A partir do movimento slow food, todo o restante se desenvolveu até se tornar uma filosofia de vida completa.
Uma reflexão pessoal
Tive a imensa sorte de conhecer algumas cidades pequenas do sudeste asiático e uma das primeiras coisas que me chamou a atenção foi a calma com a qual levam a vida. Não há um canto sequer em que não se veja pessoas acenando com a cabeça. Estejam elas andando de moto, subindo escadarias nas ruas, andando em algum parque ou montadas em alguma vaca.
Começam seus dias bem cedo e a maioria vive de modo humilde. Me atrevo a dizer que nunca faltam sorrisos ou gestos de ajuda. Além do mais, sobretudo em países de religião budista, a prática da meditação é bastante difundida. Esses são verdadeiros especialistas em slow living. Que inveja, não?