Psicologia genética: o que é e quais os seus objetivos?
Ao contrário do que se poderia supor, a psicologia genética não está relacionada a fatores hereditários. Nesse caso, o termo “genético” refere-se à “gênese” (origem ou desenvolvimento ) e não aos genes.
Essa disciplina é, então, o estudo experimental da ontogênese da cognição. Ou seja, é o campo psicológico que se concentra em investigar como o conhecimento se desenvolve e evolui no ser humano ao longo da vida.
De onde vem a psicologia genética?
Também conhecida como psicologia do desenvolvimento, tem suas raízes na Grécia antiga. Filósofos como Platão, Aristóteles e Kant buscaram respostas para questões como “o que é conhecimento?” ou “como o homem sabe?”
Platão, um racionalista, sustentava que o conhecimento era alcançado através da razão. Em contraste, Aristóteles valorizava a importância dos sentidos. Por sua vez, Kant propôs que resulta da interação entre os sentidos, a experiência e a razão, e destacou a participação ativa do sujeito no processo de aprendizagem.
Mas a psicologia do desenvolvimento como campo moderno consolidou-se no século XX tendo Jean Piaget como principal referência. Entre outras influências biológicas, comportamentais e, em menor grau, psicanalíticas, o proeminente pensador suíço pegou algumas ideias da abordagem sociocultural de Lev Vygotsky, que enfatizava o valor do contexto na aprendizagem, e integrou-as na sua visão construtivista.
Com base nisso, o construtivismo enfatiza que a aprendizagem é um processo ativo e dinâmico. As experiências do indivíduo, juntamente com as suas capacidades internas, desempenham um papel crucial na formação do conhecimento. Assim, sob essa lógica, as pessoas não são recipientes passivos de informação, e sim criam conhecimento através da interação com o ambiente.
Objetivos desse campo
A psicologia genética é o núcleo empírico da epistemologia genética piagetiana, que se concentra nos mecanismos e processos específicos que permitem a aquisição e evolução do conhecimento.
Esse ramo psicológico busca compreender como aprendemos a pensar, raciocinar e compreender o mundo. Centra-se no processo experimental e tem como principais objetivos:
- Investigar o processo de aprendizagem: explorar como adquirimos, organizamos e utilizamos conhecimentos e habilidades ao longo da vida.
- Compreender o desenvolvimento cognitivo: analisando como e por que as habilidades cognitivas (pensamento, memória e linguagem) mudam da infância até a idade adulta.
- Estudar os agentes de influência: examinar como os fatores biológicos (genética e cérebro), os fatores ambientais (educação e cultura) e as interações entre eles influenciam o desenvolvimento psicológico.
- Desenvolver modelos teóricos: criar teorias que expliquem os padrões e fases da cognição, como os estágios do desenvolvimento cognitivo propostos por Piaget, e a relação que existe entre estes e a evolução emocional.
Outro de seus propósitos: aplicar descobertas à educação
Atualmente, outra das finalidades desse campo consiste em aproveitar as descobertas para aplicá-las no campo educacional e pedagógico. Isso envolve usar o que sabemos sobre o desenvolvimento da cognição humana para projetar métodos de ensino eficazes.
A psicologia do desenvolvimento enfatiza que a participação ativa constitui a formação do conhecimento. Por essa razão, as escolas frequentemente implementam atividades práticas e experimentais. Por exemplo, ao germinar plantas, os alunos têm a oportunidade de participar e observar um processo biológico em tempo real. Assim, aprendem sobre a fotossíntese, o ciclo de vida das plantas e a importância da água e da luz.
Além disso, esse ramo demonstrou que as crianças em idade pré-escolar aprendem melhor através da brincadeira, o que levou a programas educativos para essa idade, incluindo atividades lúdicas que promovem a aprendizagem.
O método de Piaget como ferramenta da psicologia genética
Jean Piaget estava interessado em psicologia, biologia e educação. Sendo um homem de ciência, ele optou por estudar o conhecimento das crianças através de um método científico em vez de um método especulativo. Essa escolha foi inovadora num momento em que muitos pesquisadores seguiam a abordagem psicanalítica.
Sua técnica é conhecida como “método clínico-crítico”, ferramenta fundamental da psicologia genética. Com isso, Piaget coletou dados que apoiaram suas teorias sobre o desenvolvimento cognitivo. A seguir, exploraremos seus recursos.
- Estudos longitudinais: o objetivo era acompanhar as mesmas pessoas ao longo do tempo e observar a evolução de suas habilidades cognitivas em diferentes estágios de desenvolvimento.
- Entrevistas clínicas: explorou o raciocínio das crianças através de entrevistas abertas e conversas informais. O objetivo deles era que os meninos explicassem como chegaram às suas conclusões. Em vez de seguir um protocolo rígido, ele adaptou as perguntas com base nas respostas de cada criança.
- Tarefas experimentais: aplicava esses tipos de tarefas a crianças para avaliar habilidades cognitivas específicas e testar hipóteses sobre como elas entendem conceitos abstratos e lógicos. Por exemplo, na tarefa de conservação de líquidos, ele mostrava dois recipientes com a mesma quantidade de líquido, depois despejava um em outro copo de formato diferente e perguntava se a quantidade havia mudado.
- Observação naturalista: Piaget conduziu observações sistemáticas de crianças em seu ambiente para entender como elas interagem com o mundo. Observava como elas beincavam, conversavam e resolviam problemas. Ele prestava atenção aos seus erros e mal-entendidos, considerando-os pistas valiosas sobre o desenvolvimento cognitivo.
O método clínico-crítico é um processo no qual o pesquisador interage com o entrevistado por meio de perguntas e respostas, obtém informações e, por sua vez, promove transformações.
Contribuições da técnica piagetiana para a compreensão do desenvolvimento cognitivo
Graças ao seu método científico de psicologia genética, Piaget formulou conceitos-chave para compreender como sabemos e como passamos de um tipo de conhecimento para outro mais complexo.
Conceito de ação
Para o epistemólogo suíço, o conceito de ação é essencial na construção do conhecimento. Mas não se refere simplesmente a qualquer atividade física ou movimento, mas antes centra-se na “ação cognitiva”, que envolve dois elementos cruciais:
- Está orientado para os objetos do mundo: em algum momento, essa direcionalidade envolve uma intenção. Por exemplo, uma criança brinca com blocos de construção com a intenção de empilhá-los formando uma torre.
- Produz sentido: cada vez que a torre desaba, entende que precisa distribuir o peso de forma diferente.
Assim, para que o conhecimento se originasse, seria necessária uma ação cognitiva.
Conceito de esboço
Esquemas são estruturas mentais que as pessoas usam para organizar e interpretar informações. Eles se ajustam por meio da assimilação (usando o que já sabemos para compreender algo novo) e da acomodação (alterando nossos esquemas para adicionar novas informações).
Esse conceito acrescenta que o desenvolvimento cognitivo avança através de um processo de equilíbrio entre assimilação e acomodação. Quando nossos esquemas não são suficientes para abordar novas experiências, ocorre um “desequilíbrio”. Isso nos leva a ajustar ou alterar esses esquemas para nos adaptarmos e regressarmos ao equilíbrio.
Teoria dos estágios do desenvolvimento cognitivo
Como resultado do estudo empírico do desenvolvimento cognitivo, a psicóloga constatou que o progresso do pensamento ocorre, em linhas gerais, nesta série de fases sequenciais:
- Sensorimotor (0 a 2 anos): os bebês desenvolvem a compreensão do mundo por meio dos sentidos e das ações. Nesse período, obtêm a permanência do objeto, ou seja, a compreensão de que esses objetos continuam existindo mesmo quando não os veem.
- Pré-operacional (2 a 7 anos): começam a usar a linguagem e o raciocínio simbólico, mas seu pensamento ainda é egocêntrico e não possui lógica operacional.
- Operacionais concretos (7 a 11 anos): desenvolvem habilidades de raciocínio lógico e podem realizar operações mentais em objetos concretos.
- Operacionais formais (11 anos ou mais): começam a pensar de forma mais abstrata, lógica e sistemática. Eles podem lidar com problemas hipotéticos e pensar em termos de possibilidades futuras.
Psicologia genética e genética comportamental não são a mesma coisa
Para evitar confusão, é importante diferenciar essas áreas de estudo. Já mencionamos que a psicologia genética não está tão relacionada aos genes. Em vez disso, seu interesse principal reside em como as habilidades mentais se originam e evoluem.
Enquanto isso, a genética comportamental concentra-se no papel que os genes e o ambiente desempenham na variabilidade do comportamento e das características psicológicas. Ou seja, investiga a influência desses elementos em traços como personalidade, inteligência e predisposição a determinados transtornos.
Um ramo valioso para entender a evolução do conhecimento
Neste artigo, aprendemos que essa disciplina oferece ferramentas valiosas para pesquisadores e profissionais de pedagogia e educação, sobre como acessamos o conhecimento.
A psicologia genética de Piaget é um campo que evolui para uma compreensão mais profunda e matizada do desenvolvimento humano. Sem dúvida, é um recurso importante até para compreender o papel que desempenhamos na complexidade das nossas ideias.
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