Ansiedade em crianças e adolescentes, sob o olhar de especialistas


Escrito e verificado por o médico Leonardo Biolatto
A ansiedade é uma resposta natural do corpo. Ao longo de milhares de anos, ela permitiu que os humanos sobrevivessem. E embora passemos por episódios desse transtorno em todas as idades, durante a infância e a adolescência eles apresentam características particulares.
Diana Martín, licenciada em psicologia e registada em Tenerife (T-04171), esclarece no podcast Psicología Contigo que: “existem sintomas que são mais clássicos na infância e na adolescência, mas a ansiedade é, em princípio, sempre adaptativa”. É uma resposta de luta ou fuga que nosso corpo desencadeia quando interpreta que algo pode ser perigoso.
Ansiedade é a mesma coisa que medo?
Os conceitos de medo, fobia e ansiedade não são iguais. Embora seja comum que essa confusão apareça no contexto da psicoterapia infantil, vale destacar as diferenças.
Um quadro ansioso é uma resposta a uma ameaça. É algo natural e esperado, mas quando é ultrapassado aparecem os transtornos.
Embora tenhamos uma visão muito negativa desses episódios, devemos compreender que eles são necessários. Sem essa resposta, não haveria evolução humana. Talvez nem existíssemos hoje como espécie, já que nos serviu em múltiplas ocasiões para escapar dos perigos ou enfrentá-los com sucesso.
Por outro lado, o medo é uma emoção natural que, se atender a determinados parâmetros de acordo com o desenvolvimento da criança, é considerada normal. “É de se esperar uma criança que, até aos dois anos, tenha medo da separação dos pais ou, aos seis anos, tenha medo de seres imaginários”, pontua Diana Martín como exemplos. Quando o medo é excessivo, entramos no reino das fobias.
Segundo algumas estatísticas, cerca de 7% das crianças e adolescentes entre 3 e 17 anos apresentam ansiedade. Por sua vez, estima-se que entre 3% e 15% da população mundial tenha alguma fobia específica.
Por que a ansiedade excessiva aparece nas crianças?
Todas as crianças terão ansiedade em diferentes momentos de suas vidas. É uma resposta fisiológica. Mas por que em algumas pessoas essa sensação se manifesta de forma extrema e gera um transtorno?
“A origem da ansiedade é multifatorial”, postula Diana Martín. Está relacionada a fatores biológicos, genéticos, psicológicos e sociais. Vejamos cada um deles em detalhes:
- Psicológicos: principalmente, as vivências e como lidamos com elas na infância. Tudo isso gera traços emocionais de traumas, tanto do que vivenciamos quanto do que não vivenciamos.
- Biológicos: desequilíbrios nas concentrações de neurotransmissores, como serotonina ou dopamina, podem influenciar a regulação emocional. Também alterações na modalidade de resposta do sistema nervoso autônomo, principalmente na ativação do sistema nervoso simpático.
- Genéticos: há evidências de que existem genes associados ao desenvolvimento de transtornos de ansiedade e depressão. Existem também pessoas que são hipersensíveis ao estresse devido a traços de temperamento que herdaram. Porém, a genética não determina completamente e a interação com elementos do meio ambiente é crucial.
- Sociais: o ambiente familiar pode influenciar muito a forma de enfrentamento da criança. Os estilos educacionais que os adultos implementarem serão fundamentais. A superproteção e o apego evitativo estão associados à ansiedade extrema na infância. Pelo contrário, o apego seguro, com afeto e limites, seria protetor. Aqui também deve ser mencionada a rede social de apoio, incluindo amigos.
Tipos de ansiedade em crianças
Esse transtorno pode se manifestar de diversas maneiras durante a infância. Os sintomas de ansiedade nas crianças variam e às vezes haverá expressão verbal ou não. A seguir, estão as apresentações mais comuns:
- Transtorno do pânico: é a forma aguda da ansiedade. Os sintomas aparecem repentinamente com manifestações físicas, como palpitações e falta de ar.
- Transtorno de ansiedade social: é o medo de situações sociais com outras pessoas. Geralmente, são crianças que não querem ir à escola ou que preferem não sair com os colegas por medo de julgamentos.
- Transtorno de ansiedade generalizada (TAG): é uma forma extrema e grave. As crianças apresentam múltiplos sintomas, como pesadelos, choro frequente, irritabilidade, dificuldade de concentração e falta de apetite.
- Transtorno de ansiedade de separação: é uma ansiedade necessária ao desenvolvimento do bebê. Geralmente, manifesta-se por volta dos 8 meses, quando a criança tem medo de estranhos e expressa desespero ao ser deixada sozinha ou perder de vista os pais. A persistência desse comportamento para além da idade pré-escolar deve ser abordada.
Por que os episódios de ansiedade aparecem na adolescência?
Os adolescentes podem ter dificuldades em controlar as emoções que vêm desde a infância. A adolescência é uma fase de labilidade emocional, por isso o risco de sofrer de transtornos mentais é maior.
Segundo a psicóloga Martín, muitos jovens não entendem o que está acontece com eles e são os primeiros a se desesperar por causa disso.
Fatores que influenciam a ansiedade do adolescente
Os hormônios desempenhariam um papel importante no comportamento ansioso. O cortisol, molécula associada ao estresse, está elevado no período da adolescência. Quando há excesso de cortisol, o processamento emocional e a capacidade de tomada de decisão são afetados.
Outro fator é a família. A primeira rede de contenção que deveria estar presente pode falhar. Uma família que proporcionou espaço de diálogo e uma base sólida de conexão desde a infância dá ao adolescente a oportunidade de enfrentar melhor seus problemas. Pelo contrário, a ausência desses fundamentos favorece comportamentos ansiosos.
“Há adolescentes que não falam com os pais sobre questões de peso emocional porque a sua família não se interessou anteriormente por coisas com menos peso emocional, como os seus interesses quotidianos”.[/ atomik-quote]
Nos tempos em que vivemos, a conectividade digital também desempenha o seu papel nos transtornos de ansiedade. Os jovens veem imagens irreais de referências nas redes sociais e querem se parecer com elas, expondo-se a um juízo de valor e com o objetivo de buscar aprovação externa através de likes ou comentários. “Na minha opinião, os adolescentes não deveriam ter redes sociais”, diz Martín.
[atomik-read-too text="Leia mais" title="Chemsex, depressão e ansiedade: como estão relacionados?" url="https://amenteemaravilhosa.com.br/chemsex-depressao-e-ansiedade-como-estao-relacionados/"][/atomik-read-too]
Como a ansiedade é diagnosticada em crianças e adolescentes?
O diagnóstico de transtorno de ansiedade, tanto em crianças quanto em adolescentes, requer avaliação por profissionais de saúde mental. Primeiramente, será realizada uma entrevista para obter informações sobre os sintomas e sua duração.
Então, o próximo passo é buscar uma confirmação com alguns questionários padronizados ou escalas de avaliação especialmente concebidas, como as seguintes:
- General anxiety disorder-7 (GAD-7): foi desenvolvido para adultos, mas também pode ser usado para adolescentes.
- Escala de ansiedade pré-escolar (PAS): foi desenvolvida apenas para avaliar a ansiedade em crianças em idade pré-escolar.
- Busca de transtornos emocionais relacionados à ansiedade infantil (SCARED): é uma escala que avalia sintomas em diversas áreas.
- Escala de ansiedade infantil de Spence (SCAS): abrange vários tipos de ansiedade, como ansiedade de separação, fobia social, ansiedade generalizada e outros transtornos específicos.
[atomik-in-text]As escalas são utilizadas como parte integrante do diagnóstico, mas não constituem a avaliação completa. A interpretação dos resultados deve ser feita no contexto de cada paciente.[/atomik-in-text]
Quais são as opções de tratamento?
A terapia cognitivo-comportamental e o uso de medicamentos inibidores seletivos da recaptação da serotonina demonstraram eficácia no tratamento de transtornos de ansiedade na infância, de acordo com as Guía de práctica clínica da Academia Americana de Psiquiatria de Crianças e Adolescentes.
Como parte da terapia cognitivo-comportamental, estão incluídas técnicas de exposição gradual a situações temidas, reestruturação cognitiva e aprendizagem de habilidades de enfrentamento. Com crianças mais novas, a ludoterapia é uma alternativa válida.
Quanto aos medicamentos, os mais prescritos são a fluoxetina e a sertralina. Quase sempre respeitando a idade mínima de indicação de 6 anos.
Estratégias a serem implementadas pela família para lidar com a ansiedade infantil
A consulta com um profissional de saúde mental é essencial se houver suspeita de transtornos de ansiedade em uma criança. A primeira coisa que o psicólogo fará é certificar o diagnóstico e determinar se existe ou não um processo que precisa de apoio.
Para isso, “devemos compreender que o problema de ansiedade que uma criança pode ter não está isolado do ambiente familiar”, afirma Diana Martín. A forma como a família se regula emocionalmente tem muito a ver com a ansiedade infantil.
A regulação emocional, quando somos crianças, se dá através de figuras de referência. Os pequenos são regulados pelos pais. Portanto, as estratégias para reduzir a ansiedade em nossos filhos terão os pais como os principais envolvidos.
Portanto, a ideia de que o adulto leve a criança para terapia, deixe-a uma hora por semana e depois vá buscá-la não faz sentido. A falta de envolvimento do ambiente familiar impede o trabalho terapêutico sistêmico.
Estratégias para acompanhar a ansiedade em adolescentes
A comunicação é o pilar de sustentação. No ambiente familiar, se o adolescente não se sentir confiante o suficiente para se abrir e comentar o que está acontecendo com ele, será difícil prestar apoio, pois o próprio hermetismo da idade trabalhará contra ele.
Essa comunicação assertiva inclui conscientizá-los da preocupação dos adultos, mesmo que a resposta esperada não seja recebida. Você pode dizer a eles algo como: “Estamos preocupados e estamos dispostos a conversar sempre que quiser.”
[atomik-quote author="Lic. Diana Martín"]“Quando um pai ou uma mãe querem se aproximar do adolescente e não podem, pelo menos devem deixar claro que estão acessíveis, que se em algum momento precisarem deles, os filhos posso contar com eles.”
Uma opção a propor é a escrita terapêutica. Ou seja, escrever para canalizar o que está acontecendo. É claro que isso deve ser adaptado ao mundo digital dos adolescentes, com a opção de eles fazerem anotações no celular, por exemplo.
A ansiedade é multifatorial e o ambiente é fundamental para ajudar
Um transtorno de ansiedade não pode ser atribuído a uma única causa, principalmente em crianças e adolescentes.
É possível prevenir o problema? Com uma comunicação familiar aberta e assertiva baseada no apego seguro, é pelo menos viável reduzir o risco de nossos filhos passarem por um estado de extrema ansiedade.
Sempre considere procurar ajuda de um profissional de saúde mental. Por meio de diferentes abordagens, o psicólogo oferece técnicas de gerenciamento de estresse, relaxamento, respiração e mindfulness. Ele também atua com a criança ou o adolescente para abordar situações específicas que causam ansiedade, ajudando-os a mudar padrões de pensamentos negativos e distorções cognitivas.
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